
Visão restaurada
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Poder da oração
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Por Lilia Barros*
Segundo vários dicionários, como o Michaelis, o termo omissão significa ausência de ação, inércia, falta de atenção e cuidado, descuido, negligência. Na Bíblia, essa palavra se refere à responsabilidade moral, ética e espiritual, e, em diversos contextos, omitir algo é considerado pecado. Isso porque, geralmente, trata-se de negligenciar uma obrigação, esconder a verdade ou falhar em fazer o bem. A Escritura relata inúmeras histórias de pessoas que decidiram não agir diante de situações adversas, eximindo-se de qualquer responsabilidade. Foi o caso do rei Davi ao não corrigir Amnom por seu ato (2 Sm 13.14), ao não acolher Tamar após ter sido violentada (2 Sm 13.21,22) e ao não repreender Absalão por ter matado o irmão, Amnom (2 Sm 13.28,29,39). Outro exemplo está descrito na parábola do bom samaritano, contada por Jesus, na qual sacerdote e levita viram um homem precisando de ajuda, mas nada fizeram (Lc 10.25-37). [No final dessa reportagem, leia o quadro Exemplos bíblicos de omissão].

Foto: Arquivo pessoal
O Pr. Wilson Porte Jr., da Igreja Batista da Liberdade, em Bela Vista, na zona central de São Paulo (SP), frisa que deixar de agir, quando é necessário praticar o bem, evidencia a incredulidade. “As boas ações são um reflexo de uma transformação interior”, enfatiza o ministro, acrescentando que a salvação vem pela fé e que esta pode ser vista pelos frutos. “As práticas solidárias não devem requerer esforço: precisam surgir de maneira natural na vida do cristão.”
O pastor batista afirma ainda que não confrontar uma pessoa que está vivendo fora dos padrões bíblicos também é ser omisso. Ele recorda os escritos do apóstolo Paulo sobre os crentes de Corinto, que faziam vista grossa para a imoralidade. “Paulo orientava que cada homem deveria ter a sua esposa, e cada mulher, o seu marido (1 Co 7.2). Quando a igreja não se posiciona contra o erro, significa o mesmo que aprovar a prática pecaminosa”, pontua Wilson, observando, entretanto, que a abordagem durante a exortação deve ser sempre feita com brandura.

Foto: Arquivo pessoal
O Pr. Levi Matos Marins, reitor do Instituto Bíblico Beth-Le-Hem, em Vila Margarida, na cidade de Itaguaí (RJ), segue essa mesma linha de raciocínio. De acordo com ele, a Igreja de Jesus falha quando não se opõe às falsas doutrinas. “Considerar que membros de seitas são irmãos em Cristo torna algumas igrejas omissas”, opina Marins. Ele chama a atenção para um episódio marcante narrado no Livro Sagrado. “Jacó foi negligente quando deixou a critério dos filhos a decisão de unir o povo de Israel às filhas dos cananeus (Gn 34.9) e consentiu que Diná se casasse com um deles”, pontua o teólogo, ressaltando que o filho nascido dela poderia ser sacrificado ou mesmo passado no fogo, já que essa era uma prática dos cananeus. “Jacó deveria ter negado a proposta de unir os dois povos. A maioria dos filhos aceitou, mas Simeão e Levi rejeitaram. O filho de Isaque não exerceu a sua autoridade de patriarca e, infelizmente, omitiu-se”, lamenta Marins.

Foto: Arquivo pessoal
O Pr. Elias Soares de Moraes, da Assembleia de Deus – Ministério do Ipiranga, na zona sul da capital paulista, cita casos em que pastores têm conhecimento de ações graves, mas preferem se eximir. “Dentro das igrejas, há líderes que acobertam colegas de ministério pastoral e membros que praticam até crimes, como pedofilia e roubos. Além disso, protegem aqueles que têm transtornos narcisistas ou que lesaram os cofres da congregação”, denuncia Moraes, alertando para o fato de que, em vez de adverti-los, tais lideranças permitem que essas pessoas mudem de igreja ou de região para que perpetuem suas transgressões. “Isso é omissão. Sempre que o bem deixa de ser feito, o mal está presente. Afinal, omitir-se é, na prática, o mesmo que cometer maldade.”

Por sua vez, o Pr. Hélder Cardin, auxiliar na Igreja Evangélica Batista Nova Aliança, em Ribeirão Preto (SP), cita a exortação do apóstolo Tiago: Aquele, pois, que sabe fazer o bem e o não faz comete pecado (Tg 4.17). “Ele estava descrevendo, em sua carta, algo que conhecemos bem: o pecado da negligência, manifestado pela falta de solidariedade”, explica o ministro batista, advertindo que muitos acreditam que o pecado ocorre unicamente por meio de uma ação deliberada e intencional. “No entanto, quando o crente deixa de fazer aquilo que é correto, está pecando. Na maioria das vezes, nós nos preocupamos mais com o que estamos fazendo de errado do que com o certo que deixamos de realizar.”

Foto: Arquivo pessoal
Desinteresse e negligência – O Pr. Hélder Cardin ressalta que a omissão pode estar presente no campo profissional. Ele cita o exemplo de um policial que, ao invés de multar um infrator de trânsito, não aplica a penalidade. “Nesse caso, podemos dizer que houve omissão no exercício de suas prerrogativas profissionais, pois ele não cumpriu o que lhe era exigido”, sublinha o pastor. Cardin acrescenta que o mesmo pode acontecer no casamento quando o marido deixa de amar a esposa como Cristo amou a Igreja ou quando a mulher não respeita o esposo, assim como a Igreja está submissa a Cristo (Ef 5.22-33). O ministro observa que essa lógica também se aplica aos pais que se preocupam apenas com a educação intelectual dos filhos, negligenciando a formação cristã do caráter deles, como ensinado pelo apóstolo Paulo: Vós, filhos, sede obedientes a vossos pais no Senhor, porque isto é justo. Honra a teu pai e a tua mãe, que é o primeiro mandamento com promessa, para que te vá bem, e vivas muito tempo sobre a terra. E vós, pais, não provoqueis a ira a vossos filhos, mas criai-os na doutrina e admoestação do Senhor (Ef 6.1-4).

Foto: Arquivo pessoal
Em 1994, a professora particular e assessora parlamentar Luciene Araújo, 55 anos, tinha uma rotina extremamente agitada. Ela conciliava os estudos na faculdade, o estágio e as aulas de Inglês, o que a deixava muito ocupada. Naquele ano, apesar de perceber que uma grande amiga não estava bem e havia se afastado, Luciene não tomou nenhuma providência, justificando a falta de tempo para procurá-la. “Após cinco meses, descobri que ela havia passado por uma depressão profunda e tomado mais de 30 comprimidos de um remédio muito forte, ficando dois meses internada. Ela quase morreu”, testemunha Luciene. A integrante da Igreja Batista do Calvário, no bairro Shell, em Linhares (ES), acrescenta que a sobrevivência de sua amiga foi um milagre. “Passei anos me cobrando por não ter agido”, recorda-se, convicta de que recebeu o perdão de Deus por aquela falha.

Foto: Arquivo pessoal
Mestre em Teologia e diretor do Seminário Martin Bucer, em São José dos Campos (SP), o Pr. Franklin Ferreira explica que a omissão ocorre, geralmente, em situações de desinteresse ou negligência, ou seja, quando a pessoa deixa de agir em benefício do próximo ou se abstém diante de injustiças ou sofrimentos. Contudo, ele lembra que, na conhecida parábola do bom samaritano (Lc 10.25-37), citada no início desta reportagem, as condutas não são equivalentes. “Os dois erros são graves: os ladrões causaram dano físico direto ao homem, e a omissão do levita agravou ainda mais a injustiça, porque ele falhou em não cumprir com sua responsabilidade de amparar e cuidar do próximo”, analisa o teólogo, assegurando que realizar atos maus e se abster de fazer o bem violam os valores éticos e espirituais. “O resultado pode ser distinto em cada caso. Contudo, ambos afetam negativamente tanto quem comete o pecado quanto a vítima dele.”

Foto: Arquivo pessoal
Prejuízos eternos – Para o Pr. Gustavo Chiori da Silveira, da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em São Sebastião (DF), o desamparo aos necessitados está relacionado, principalmente, à desconexão com Deus. Ele pondera que, de acordo com Gálatas 6.7, a pessoa colhe aquilo que planta: Não erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará. O pastor assevera que quem omite ajuda desfrutará da ausência de apoio, e aquele que falta com a justiça vivenciará a injustiça. “As consequências e os prejuízos poderão ser eternos”, opina o ministro, citando outra frase de Paulo, esta direcionada aos Coríntios: Porque todos devemos comparecer ante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o que tiver feito por meio do corpo, ou bem ou mal (2 Co 5.10).
De acordo com Silveira, no Dia do Juízo Final, Cristo não reconhecerá os que deixaram de fazer o bem aos mais desafortunados (Mt 25.41-45). “Ignorar os mais carentes equivale a desonrar Jesus, negligenciando os Seus mandamentos, e isso desencadeia consequências espirituais graves”, expõe o ministro do Evangelho, fazendo referência a Provérbios 21.13: O que tapa o seu ouvido ao clamor do pobre também clamará e não será ouvido.

Foto: Arquivo pessoal
Do mesmo modo, o Pr. Roberto Cruvinel, professor de Grego e diretor da Escola Teológica Pastor Virgílio dos Santos Rodrigues, em São Paulo (SP), afirma que a omissão acarreta prejuízo espiritual à pessoa, considerando que a Palavra declara que o salário do pecado é a morte (Rm 6.23). Parafraseando Tiago 2.13-17, o pastor explica que o juízo será sem misericórdia sobre aquele que não fez misericórdia, porque não há proveito em dizer ao necessitado para ir em paz sem lhe dar aquilo de que necessita para o corpo. “Embora a salvação seja pela fé e pessoal, o resultado dela se exterioriza em obras, em auxílio às pessoas”, declara Cruvinel, citando as palavras do apóstolo Paulo em sua carta aos Efésios: Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas (Ef 2.10).
A Bíblia atesta que ser empático com o próximo transforma a visão de mundo e de si mesmo. Segundo o Livro santo, seguir o Salvador tem relação direta com a expressão de amor: Ninguém jamais viu a Deus; se nós amamos uns aos outros, Deus está em nós, e em nós é perfeito o seu amor. Nisto conhecemos que estamos nele, e ele em nós, pois que nos deu do seu Espírito, e vimos, e testificamos que o Pai enviou seu Filho para Salvador do mundo (1 Jo 4.12-14).
EXEMPLOS BÍBLICOS DE OMISSÃO
As Sagradas Escrituras revelam a história de pessoas que desperdiçaram a oportunidade de agir, mantendo uma postura negligente em diferentes circunstâncias. Confira alguns exemplos:
– Eli e seus filhos (1 Sm 2.12-17; 22-36): Mesmo sabendo do pecado de seus filhos, Eli, que era juiz em Israel, nada fez, preferindo honrar seus herdeiros mais do que a Deus.
– O rico e Lázaro (Lc 16.19-31): Diante de uma necessidade básica, a de alimentar um mendigo, um homem rico – que estava consciente da miséria do indigente – sequer se dispôs a lhe suprir a fome.
– Discípulos de Jesus no Getsêmani (Mt 26.36-46): Tendo ido com Jesus ao jardim do Getsêmani com o propósito de orar, os discípulos acabaram dormindo e, assim, não cumpriram a ordenança do Senhor.
– Desprezo às viúvas (At 6.1,2): A igreja em Jerusalém não atendeu às viúvas cristãs helenistas, deixando-as de fora da distribuição diária de alimentos.
– Parábola dos talentos (Mt 25.14-30): Um dos homens que recebeu recursos de seu senhor para cuidar e investir, optou por esconder seu talento e deixou de gerar os lucros pretendidos pelo proprietário.
(Fonte: Bíblia Sagrada).