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Experiências religiosas na internet não substituem a vivência nos cultos presenciais, defendem pastores
Por Evandro Teixeira
A pandemia de covid-19 – e a quarentena que se seguiu ao surto, principalmente no ano de 2020 – colocou as igrejas cristãs diante de um grande desafio: produzir conteúdo on-line, a fim de manter o contato dos membros com suas congregações. Muitas comunidades já mantinham programações no ambiente virtual, mas, naquele momento, em lugar de uma ação esporádica ou opcional, estar presente na web se tornou vital.
Nesse cenário, há quem deseje entender até que ponto as pessoas se engajam em assuntos religiosos no ambiente virtual, procurando saber se aqueles que acompanham tais conteúdos on-line têm o hábito de frequentar cultos e celebrações presenciais. A pesquisadora Sarah Wilkins-Laflamme, professora de Sociologia da Universidade de Waterloo, no Canadá, buscou respostas por meio do estudo Digital religion among U.S. and canadian millennial adults (em tradução livre, Religião digital entre adultos norte-americanos e canadenses da geração Y).
Para a pesquisa, a socióloga levou em consideração um público composto apenas por jovens nascidos de 1981 a 1995. Eles são os primeiros nativos verdadeiramente digitais da América do Norte, pois foram criados desde a infância com o mundo digital na ponta dos dedos, explicou Laflamme. Segundo ela, o trabalho revelou que cada vez mais pessoas dessa faixa etária – chamadas de millennials – estão se voltando para a espiritualidade nos meios digitais. Cerca de 29% os millennials canadenses e 41% dos norte-americanos acessam a rede em busca de conteúdo religioso pelo menos uma vez por mês. Muitos deles também frequentam cultos e celebrações presenciais em igrejas ou templos ligados a alguma crença formal. Grupos de bate-papo com pastores, sermões on-line e produção de conteúdo religioso nas mídias sociais são exemplos de espaços em que esse envolvimento ocorre. Descobrimos que, embora a religião digital não esteja necessariamente atraindo muitos novos millennials, está tornando a experiência mais rica dos já envolvidos, explicou a pesquisadora. [Leia, no final desta reportagem, o quadro Digital e presencial]
Canais confiáveis – Apesar de não existirem pesquisas semelhantes no Brasil, é possível afirmar que os millennials brasileiros também usam a tecnologia digital para enriquecer suas experiências de fé. É o que aponta o servidor público Johnny Pereira da Silva, 30 anos. Para seu momento devocional diário, ele conta com a ajuda de uma Bíblia on-line no celular. Dessa forma, apesar dos compromissos e da rotina de trabalho, consegue manter seu contato com o Texto Sagrado diariamente, fortalecendo sua comunhão com Deus. Porém, faz um alerta sobre os perigos escondidos no ambiente virtual. “Além do cuidado sobre o conteúdo das mensagens na web, que devem estar centradas na Palavra, é preciso atentar para a segurança de dados e imagens”, observa Silva, obreiro na sede regional da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Governador Valadares (MG).
O líder de juventude, Maycon Felix de Oliveira, 38 anos, membro da Igreja da Graça no bairro Nacional, em Contagem (MG), opta por seguir mídias digitais sabidamente confiáveis, como as do Missionário R. R. Soares, o qual mantém um canal no YouTube em que são exibidos os programas Show da Fé, SOS da Fé e Semeando a Fé. Para Maycon, os millennials têm uma relação mais direta com a tecnologia e, por isso, são alcançados mais facilmente por ações desenvolvidas nesses espaços. Desse modo, em seu trabalho com os jovens, Maycon procura mostrar de que maneira eles podem fazer um bom uso das redes sociais. “Eu os oriento a ter sabedoria, dando preferência a canais ligados à nossa Igreja e à nossa liderança.”
O ministério do Missionário R. R. Soares está presente em diferentes ambientes digitais, como Facebook, Twitter e Instagram. O líder estadual da Igreja da Graça no Rio Grande do Sul, Pr. Victor Augusto Martins, 35 anos, enfatiza essa vocação da IIGD que, por meio da internet, está levando o Evangelho até mesmo a países fechados à pregação cristã. “A Igreja tem alcançado muitos irmãos em diferentes partes do mundo”, comenta o ministro, exaltando a força do trabalho da Igreja da Graça na web.
O pastor e psicólogo Leonardo Mathias da Silva acredita que o avanço das plataformas digitais tem ressignificado a vida religiosa de muitos, mas defende que a experiência virtual deve ocupar uma posição complementar. De acordo com ele, que é líder da Primeira Igreja Batista no Lote XV, em Belford Roxo (RJ), a experiência de culto requer a reunião de pessoas em um lugar físico. Por outro lado, reconhece que, quando a Palavra de Deus é pregada no ambiente digital, tem seu alcance ampliado. “Nessa relação entre presencial e virtual, o fundamental é o equilíbrio”, observa.
Ambiente físico – Para o Pr. Nelson Leomar Gewehr, da Igreja Batista Central em Ilha Solteira (SP), a pandemia transformou os cultos on-line na única opção para os cristãos. “Mesmo que, pela primeira vez, alguns líderes tenham conferido a eficiência dessas ferramentas.”
Entretanto, na opinião do Pr. Nilton Gomes de Abreu Júnior, da Igreja do Evangelho Quandrangular no Guerenguê, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ), passados aqueles momentos ruins da contaminação pelo coronavírus, restou a comprovação de que nenhuma interação virtual é capaz de substituir o contato humano presencial. “As pessoas têm a necessidade de estar juntas. A falta disso pode gerar problemas emocionais.”
O discurso do Pr. Nilton é o mesmo do Pr. Roberlan Julião da Silva, da Segunda Igreja Batista em Vila Pauline, no município de Belford Roxo (RJ), na Baixada Fluminense. Para ele, as ferramentas virtuais podem ser uma ponte para alcançar os “desigrejados”, aqueles que desistiram de fazer parte de uma comunidade de fé. Roberlan deixa claro, entretanto, que “as mídias digitais não devem justificar a postura dos que não desejam mais congregar” e, como argumento, cita Hebreus 10.25: Não deixando a nossa congregação, como é costume de alguns.
O Rev. Welfany Nolasco Rodrigues, líder da Igreja Metodista Nova Canaã, em Cachoeiro de Itapemirim (ES), ressalta que o vínculo com uma igreja local deve ser mantido. Ele alerta que circula na internet muita desinformação acerca da Palavra e lembra que a web deve ser usada para reforçar os ensinamentos dos cultos presenciais. Rodrigues destaca: o crente deve se reger pelo compromisso irrestrito com Deus e Sua obra, evidenciando sua fé em Cristo no cotidiano, na igreja local, no contato com os irmãos e no serviço a outras pessoas. “No espaço convencional de uma comunidade cristã, será possível reafirmar seu compromisso com o Senhor Jesus”, conclui.
Digital e presencial
A pesquisa intitulada Digital religion among U.S. and canadian millennial adults (em tradução livre, Religião digital entre adultos norte-americanos e canadenses da geração y) avaliou os hábitos de consumo de conteúdo religioso dos entrevistados, assim como o engajamento deles em atividades dentro e fora do ambiente virtual. Entre as principais descobertas, citamos:
:: 11% dos jovens entrevistados disseram frequentar serviços religiosos presenciais, ligados a uma religião organizada (como cultos e missas), além de consumirem conteúdo digital voltado a questões espirituais;
:: 6% declararam que participavam de atividades religiosas presenciais não relacionadas a uma religião organizada, além de consumir conteúdo religioso digital;
:: 10% disseram que participavam dos três tipos de atividades: cultos e celebrações presenciais ligadas a uma religião organizada, reuniões não relacionadas a religiões organizadas, além de consumirem conteúdo religioso no ambiente digital;
:: 7% disseram que participavam exclusivamente de serviços religiosos ligados a religiões organizadas;
:: Apenas 5% dos entrevistados informaram consumir exclusivamente conteúdo religioso digital, sem tomar parte em qualquer atividade presencial de cunho espiritual.
(*Élidi Miranda, com informações de The Christian Post)