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01/10/2022Médico e servo
O britânico Paul W. Brand revolucionou o tratamento da hanseníase no mundo, enquanto trabalhava como missionário na Índia
Por Élidi Miranda*
Nunca conheci alguém que fosse tão brilhante e, ao mesmo tempo, tão humilde. […] Ele provou para mim que a vida cristã, de que ouvira falar na teoria, poderia de fato ser vivida na prática. Vi que é possível alcançar sucesso sem perder a humildade, servir aos outros com sacrifício e ainda ter alegria e contentamento. Essas palavras, ditas pelo renomado escritor cristão estadunidense Philip Yancey, autor de vários best-sellers, resumem o impacto que sua amizade com o cirurgião e missionário britânico Paul W. Brand (1914-2003) teve sobre a sua fé. Contudo, esse relato é apenas um resumo da genialidade e da humildade de Brand, que dedicou todos os seus extraordinários talentos como cirurgião ao serviço de seu amado Mestre, Jesus.
Filho de missionários britânicos, Brand nasceu no estado de Tamil Nadu, no Sudeste da Índia, em 1914. Em uma casa simples, onde não havia água encanada ou energia elétrica, aprendeu a ler, a escrever e conheceu seu Salvador. Aos nove anos, foi para a Inglaterra a fim de estudar. Dez anos depois, ingressou na faculdade de Medicina.
Brand já tinha 29 anos quando se casou com a médica Margaret Berry, em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial. Nesse período, ele começou a desenvolver suas habilidades como cirurgião ortopédico, ajudando soldados que haviam sofrido amputações em batalha. Em 1946, o casal seguiu para a Índia, para trabalhar na Faculdade Cristã de Medicina em Vellore, no Leste do país.
A situação dos indivíduos com hanseníase – na época, ainda chamados de leprosos – cortava o coração do médico. Eram numerosos, permaneciam isolados do restante da sociedade e se tornavam fisicamente incapacitados pela doença. Perdiam partes das mãos e dos pés, e muitos ficavam cegos. Naquele tempo, pouco se sabia sobre essa enfermidade, principalmente, sobre a causa das lesões nas extremidades dos membros. Acreditava-se que isso era decorrente da própria mazela.
O Dr. Brand passou a pesquisar incessantemente sobre o assunto. A primeira barreira a ser enfrentada era o preconceito: ninguém jamais vira, pelo menos na Índia, um médico enfronhado no meio das pessoas com hanseníase. Afinal, a maioria delas pertencia à casta mais baixa da sociedade indiana, os dalits, ou intocáveis. No entanto, a despeito de todas as dificuldades, o médico continuou a estudar a perda de sensibilidade e de força muscular nos membros de seus pacientes.
Dádiva da dor – Desse modo, Paul Brand revolucionou o tratamento da hanseníase. Ele descobriu que as lesões não se davam por uma degeneração natural dos tecidos, mas pela falta de sensibilidade à dor nas regiões afetadas – já que a doença ataca o sistema nervoso. Naquela época, o médico cunhou a expressão dádiva da dor. Sem ela, as pessoas com hanseníase se machucavam e sofriam lesões graves, sem perceber. Brand começou a fazer uma reflexão médico-teológica sobre o que considerou o aspecto mais problemático da criação: a existência da dor. O missionário concluiu que essa não era um obstáculo à vida, e sim um pré-requisito para ela. Deus teria planejado o corpo humano de tal forma que pudesse sobreviver por causa da dor.
De posse daquele conhecimento acerca da doença, o Dr. Brand começou a ajudar os pacientes a se prevenirem das lesões, protegendo as áreas insensíveis. Além disso, o hábil médico passou a desenvolver uma técnica cirúrgica revolucionária de transferência de tendões das mãos afetadas pela hanseníase. No procedimento, um tendão era usado para suprir a função de outro que não estivesse mais presente devido a alguma lesão.
Depois de 18 anos na Índia, Paul e Margaret foram convidados a chefiar o setor de reabilitação no Centro Nacional de Hanseníase do Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos em Carville, no estado da Louisiana. Ali, marido e mulher continuaram a colaborar com a obra missionária junto aos doentes de hanseníase. Brand desenvolveu outras técnicas de reabilitação, criando sapatos e ferramentas para pacientes com insensibilidade nervosa.
Ao contrário do que se dá com vários cientistas, as descobertas de Brand o levaram para mais perto de Deus. Depois de 40 anos como cirurgião da mão, descobri que não há nada na natureza que se compare com a combinação de força, agilidade, tolerância e sensibilidade deste membro do corpo. Usamos nossas mãos para as atividades mais maravilhosas: para fazer arte e música, para escrever, curar e tocar, declarou.
Diante de suas descobertas, ele escreveu sete livros e recebeu o Prêmio Albert Lasker, em 1960, por sua extraordinária liderança e serviço na reabilitação dos incapacitados. Brand também foi condecorado pela Rainha Elizabeth II como Comandante da Ordem do Império Britânico, em 1961. Mas ele estava mesmo almejando outra premiação, a mais importante de todas: a vida eterna.
O servo incansável do Senhor morreu em 2003, aos 89 anos, devido a complicações de uma queda, em Seattle, nos EUA. Muito antes de sua morte, ele escrevera sobre esse momento: Minha oração é que, quando chegar minha hora, não reclame que meu corpo se desgastou tão rápido, mas que mantenha firme a gratidão por ter estado há tanto tempo no leme da criação mais maravilhosa que o mundo já conheceu [o corpo humano], e que sinta a expectativa de encontrar-me face a face com o Projetista dela. (*Élidi Miranda, com informações de Christianity Today, Revista Impacto e International Leprosy Association)