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Crescimento da secularização e declínio da fé cristã no continente europeu são desafios para a Igreja
Por Patrícia Scott
O último censo da Escócia indica que a maioria dos habitantes desse país declara não seguir nenhuma religião. Pela primeira vez, o número de pessoas que professam alguma identidade religiosa foi superado. Em outras nações, como Inglaterra e França, prédios de igrejas têm sido vendidos devido à falta de membros. Na Holanda, templos se tornaram bares, cafeterias e até cervejarias. Esse cenário é um dos reflexos da secularização na Europa, em curso há anos.
E, segundo estudiosos, nos últimos tempos, houve um aprofundamento desse processo de separação, ou gradual abandono, das formas tradicionais de estruturação social com base na religiosidade. Historiadores e geógrafos dizem que esse movimento se deve ao surgimento de um modo de vida não mais estruturado em preceitos e hábitos religiosos.
Assim, países europeus que foram berço do protestantismo têm caminhado na contramão dos ensinamentos da Palavra de Deus. É o que observa o Pr. André Fonseca, da Igreja Batista do Povo em Oxford, cidade da região Centro-Sul da Inglaterra. Ele afirma que a secularização na Europa tem se intensificado ao longo das últimas décadas, manifestando-se de formas diversas. “Na Escandinávia, por exemplo, a secularização é caracterizada por uma alta taxa de agnosticismo e ateísmo, enquanto na parte sul do continente, ainda que considerando a redução da frequência à igreja, muitos se identificam culturalmente com o catolicismo”, afirma o pregador. [Do editor: A Escandinávia é uma região geográfica e histórica da Europa Setentrional que abrange Dinamarca, Suécia e Noruega. Em um contexto mais amplo, inclui Finlândia, Islândia, Ilhas Faroé, as ilhas Åland e a Groenlândia.]
Desse modo, de acordo com o ministro batista, quando comparada a outras regiões, a Europa apresenta um quadro único de secularização avançada, diferentemente dos Estados Unidos, onde a religião ainda desempenha um papel central na vida pública. “Líderes religiosos europeus revelam preocupação crescente com a perda de relevância da fé cristã, enquanto cidadãos comuns compartilham experiências de busca espiritual fora das tradições religiosas estabelecidas.”
No entanto, mesmo diante dos desafios impostos pela secularização, o Pr. André acredita que a Igreja pode encontrar maneiras de continuar propagando o Evangelho de modo eficaz. “Por meio de ações sociais, da criação de comunidades acolhedoras e do uso estratégico da tecnologia, a mensagem de Cristo pode continuar impactando vidas na Europa”, enumera o pregador. Portanto, destaca a necessidade de demonstrar que a fé cristã é relevante para a sociedade moderna e de orar para que o Senhor mude essa situação: “A oração é fundamental. Caso contrário, as estratégias não funcionarão, porque dependemos de Deus,” ratifica.
Fonseca salienta ser importante fomentar a educação religiosa e organizar debates, seminários e cursos sobre o tema, a fim de aumentar a compreensão e o respeito pelas tradições cristãs. “Essa abordagem educacional pode atrair aqueles que estão em busca de respostas para questões existenciais e espirituais, criando um ambiente no qual a fé pode ser discutida de forma aberta e respeitosa”, garante.
Crise de valores – Na opinião do Pr.Rui Ribeiro, ministro auxiliar na Igreja Baptista de Queluz, em Portugal, a Europa está espiritualmente doente, imersa em uma crise de valores e incapaz de admitir que tem um problema profundo que afeta todo o resto: o pecado. “Os europeus não reconhecem esse mal e não estão dispostos a ouvir o que pode promover a cura: o Evangelho de Jesus.”
O pastor pensa que há um desânimo e um ceticismo generalizado quanto à religião e aos religiosos, inclusive porque os líderes não agem de acordo com o que pregam. Também pela ideia, bastante difundida em solo europeu, de que “é possível viver uma espiritualidade pessoal sem prestar contas a ninguém sobre isso”. O pastor salienta que, entre europeus, frases como estas: não precisamos de fé para viver a nossa vida e a divindade ou as divindades são fruto de uma noção antiquada usada para explicar fenômenos já revelados pela ciência, são bem repetidas.
Rui Ribeiro ressalta que mudar essa realidade é uma tarefa complexa. Por isso, os primeiros passos são: dedicar-se à oração e convencer as igrejas a abandonar os conflitos entre si, centrando-se na doutrina bíblica e na formação teológica. “O mundo mudou, mas a Palavra de Deus não, nem o ser humano. Este continua a ansiar interiormente por se reconectar com o Criador, pois nada mais o saciará verdadeiramente”, assegura o ministro batista, acrescentando que os avessos à religião dificilmente entrarão nos espaços das igrejas. “Precisamos criar amizades, desenvolver estratégias e ministérios e implementar células ou pequenos grupos nas casas.”
Na opinião do Pr. Hilton Santos, líder da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) na Romênia, as congregações precisam se posicionar de forma a evitar que a secularização atinja a vida dos cristãos. Para ele, o antídoto para isso é a Bíblia. “A Palavra de Deus deve ser anunciada a tempo e fora de tempo para que o Espírito Santo convença o homem do pecado, do juízo e da justiça”, afirma Santos, pontuando que a secularização está em alta em território romeno, como acontece em outras partes do continente europeu. “É um ataque que faz as pessoas se afastarem do Senhor e se envolverem em práticas mundanas. É um espírito que opera mundialmente para fazer o indivíduo se tornar cada vez mais escravo dos prazeres e menos próximo de Deus.”
Lideranças religiosas – Para o Pr. Paulo Pagaciov, além do secularismo, a chegada de imigrantes e refugiados na Europa atualmente gera outro problema grave: o crescimento de religiões e seitas variadas. Residente na Espanha e coordenador da Junta de Missões Mundiais (JMM) da Convenção Batista Brasileira (CBB) no continente europeu, Pagaciov afirma que, na nação espanhola, existe um sentimento de decepção com as lideranças religiosas, e, por esse motivo, há um número expressivo de “desigrejados”. “Os escândalos envolvendo líderes evangélicos afastam os membros das igrejas. Eles não são ateus, mas não querem fazer parte de uma congregação cujos representantes estão envolvidos em confusão”, explica.
Essa desconfiança dos europeus em relação à integridade dos ministros do Evangelho, ressalta o pastor, também dificulta a propagação da Palavra. “Há uma generalização quando se fala de evangélicos, especialmente dos líderes. É muito difícil mudar essa percepção. No entanto, o evangelismo feito por meio de amizades sinceras e saudáveis ao longo do tempo produz resultados positivos”, observa ele, pontuando que, em contrapartida, a chegada de imigrantes latinos impulsionou o crescimento das igrejas evangélicas.
“Campo de tensão” – O Prof. Jorge Pinheiro, doutor em Ciências da Religião e dirigente da Missão Fraternidade da Cruz Huguenote na França, lembra que, em muitos países ocidentais, uma tendência de secularização tem sido notada. Neles, a participação em atividades religiosas e a adesão a dogmas religiosos diminuíram ao longo do tempo. “A laicidade é uma característica do Estado, de sua relação com a religião, garantindo neutralidade e igualdade religiosa. Já a secularização é uma tendência ou um processo social de declínio da influência religiosa na sociedade”, ressalta.
Segundo Pinheiro, atualmente, devido ao aumento da diversidade religiosa e à imigração em países como a França, as questões como o uso de símbolos religiosos em espaços públicos (o véu islâmico, por exemplo), a construção de lugares de culto e os feriados religiosos geram debates intensos. Ele observa que, em território francês, a proibição da utilização de tais símbolos em escolas públicas visa preservar a neutralidade dos espaços educacionais. Por outro lado, levanta discussões sobre liberdade individual. “A integração de minorias religiosas e a manutenção de uma identidade nacional francesa fundamentada na laicidade criam um campo de tensão contínuo, especialmente diante da crescente islamofobia e xenofobia”, explica Jorge Pinheiro, acrescentando que as ameaças de terrorismo (muitas vezes, associado ao extremismo religioso) complicaram ainda mais a relação entre o Estado e as comunidades cristãs francesas. “Isso leva a medidas de segurança que impactam a liberdade religiosa no país.”
Poder da Palavra – Na opinião da Pra. Valéria Azerrad, líder da IIGD na Itália, a secularização é um processo que está ocorrendo em todo o mundo. Essa realidade, no ponto de vista dela, é resultado da iniquidade que tem esfriado o amor de muitos (Mt 24.12), conforme afirma o Senhor Jesus.
Além disso, acredita que as pessoas estão abandonando os preceitos religiosos e os laços familiares que, antigamente, consideravam importantes. “Cada um faz aquilo que deseja. O mais importante é ter liberdade”, critica a ministra, ressaltando que esse é um comportamento lamentável. “Os verdadeiros valores para que uma sociedade possa viver bem são os bíblicos.” Azerrad frisa que a estrutura familiar só se sustenta com base no amor, na paz e na tolerância.
Em países considerados católicos, como Portugal e Espanha, há uma acentuada perda da identidade cristã, sobretudo entre os mais jovens. É o que informa o Rev. Leandro Machado, líder da IIGD em terras portuguesas e espanholas. “Nessas nações, cada vez mais pessoas dizem não ter religião ou não acreditar no Altíssimo”, aponta Machado, acrescentando que esse discurso é muito comum na Europa, especialmente nas regiões nórdicas do continente.
O ministro lamenta que o envolvimento dos jovens europeus com a igreja seja difícil, uma vez que a religião não faz parte da vida deles, pois estão concentrados nas próprias ideias. “Por isso, é importante que a Igreja pregue a Palavra, que é viva e atemporal, a fim de oferecer aos mais novos as respostas para as crises existenciais, emocionais, conjugais, familiares e financeiras. Além de evidenciar os milagres de Jesus e o poder do Senhor.”