
REALIZANDO A BOA OBRA
14/07/2025
Os ministros, a Bíblia e os dons ministeriais (Introdução)
15/07/2025
Por Marcelo Santos
Nos cultos, nas reuniões de oração, nos grupos de louvor e nos ministérios de evangelismo, eles estão sempre presentes, com força, dedicação e fé. São os adultos solteiros, homens e mulheres que, mesmo em um tempo marcado por transformações sociais e afetivas, têm escolhido viver com integridade e entrega ao Senhor. Sem se deixarem abater por cobranças externas, esses irmãos e essas irmãs seguem firmes no propósito de servir, formar amizades saudáveis e crescer espiritualmente na casa de Deus.

Foto: Arquivo pessoal
De fato, o perfil desse público mudou. Atualmente, é comum encontrar solteiros com mais de 30 ou 40 anos que se dedicam à formação profissional, à obra do Senhor e ao cuidado da saúde física, emocional e espiritual. Embora ainda pouco visibilizados nas estatísticas internas das congregações, os solteiros formam uma parcela crescente da membresia. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2023, confirmam que o contingente de solteiros no Brasil é imenso – na verdade, o maior registrado na história do país –, são 81 milhões de solteiros, os quais superam o número de casados, que somam 63 milhões. Até o ano de 2040, essa quantidade pode aumentar em mais 20% em todo o mundo, segundo projeções da empresa de pesquisa Euromonitor International, sediada em Londres, na Inglaterra.

Foto: Arquivo pessoal
Tal crescimento revela também a necessidade de ampliar o olhar pastoral e a escuta sensível às diferentes realidades que compõem o Corpo de Cristo. “Há muitos irmãos e muitas irmãs que servem com excelência, mas que, por não serem casados, sentem-se à margem. É como se faltasse algo, como se estivessem incompletos”, pondera a conselheira cristã e pastora Deusirene Moreira, da Igreja Batista em Parque Araruama, no município de São João de Meriti (RJ), na Baixada Fluminense. “Precisamos acolher cada um com amor e reconhecer o valor do indivíduo, independentemente do estado civil”, aconselha.

Foto: Arquivo Graça / Marcelo Santos
Diante dessa realidade, diversas igrejas adotaram cultos temáticos e criaram grupos de solteiros. Nessas reuniões, o objetivo vai muito além de formar casais: a proposta é fortalecer a identidade cristã, promover apoio mútuo e o cuidado da saúde mental e emocional. Na sede estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em São Paulo, por exemplo, o culto da Vida Sentimental reúne dezenas de pessoas às terças-feiras, em seis horários: 6h, 9h, 12h, 14h, 17h e 19h30. Liderado pelo Pr. Guilherme Soares Andrade Rosa, o encontro acolhe tanto pessoas solteiras quanto aquelas que buscam restauração emocional e espiritual. “Mesmo sendo cristãos, muitos têm medo de escolher errado e se frustrar. Outros ficam presos à religiosidade, esperando que a pessoa perfeita caia do céu”, relata o pastor, acrescentando que Deus une propósitos, não perfeições. “O namoro é o início de um projeto de vida. O importante é que os dois tenham o mesmo objetivo: formar uma família sob a bênção do Senhor.”

Foto: Arquivo pessoal
Segundo Guilherme Rosa, durante esses cultos, temas, como preparo emocional e equilíbrio entre vida espiritual e projetos pessoais, são constantemente abordados. “A ansiedade acarreta decisões impulsivas, cujas consequências podem ser graves”, observa o ministro, o qual costuma citar o texto de Provérbios 24.27 como referência para os solteiros: Prepara fora a tua obra, e apronta-a no campo, e então edifica a tua casa.“Muita gente se sente pressionada pelos amigos, por causa da idade ou da solidão. Mas cada um tem seu tempo. É melhor estar só do que mal-acompanhado. Quando a pessoa está firme na fé e sabe o que deseja, Deus encaminha tudo.”
Dedicação à obra – No ambiente eclesiástico, o movimento é claro: cada vez mais solteiros estão assumindo posições de liderança, discipulado e evangelização. É o caso de Rosângela Célia Basile, 60 anos, profissional da área contábil e líder do grupo de evangelismo da sede estadual da Igreja da Graça em São Paulo, no Centro da capital paulista. “Sou apaixonada por Jesus. Vivo no esconderijo do Altíssimo, e, se alguém me encontrar, vai ser por missão divina”, afirma ela, confiante. “Não me sinto incompleta. Estou cheia de sonhos e de vida. Faço planos, oro, evangelizo e deixo tudo nas mãos de Deus”, acrescenta. A líder ressalta que, milhares de solteiros em todo o Brasil encontraram, na obra divina, o sentido de pertencimento e missão e estão vivendo plenamente.

Foto: Marcelo Santos
Distantes dos estigmas e das expectativas sociais que pairam sobre esses indivíduos nas igrejas evangélicas, muitos solteiros têm encontrado, na comunhão com Deus, na dedicação à obra e na missão diária de servir, um caminho de sentido e alegria. É o que testemunha a artesã Maria Aparecida dos Santos, 68 anos, membro da IIGD em Praia dos Sonhos, na cidade de Itanhaém, no litoral paulista. Ela revela ter descoberto que podia seguir um novo rumo ao se converter ao Evangelho. “Houve momentos em que me senti só, é verdade. Mas a solidão verdadeira nunca me alcança, pois busco preencher minha vida com a obra de Deus”, revela a artesã, que atua como professora voluntária na escola bíblica, faz parte do ministério Mulheres que Vencem (MQV) e integra o coral da Igreja. Maria Aparecida, que não namora ninguém há mais de 15 anos, reconhece que há julgamentos. “Alguns acham que estou sozinha porque sou exigente demais, ou até porque sou chata. No entanto, não levo essas críticas em consideração. Já conheci algumas pessoas, comecei até a conversar, mas, quando percebo que não vêm de Deus, paro por ali mesmo”, relata ela, destacando que sua fé em Cristo é inegociável.

Alicerce na fé – Tal zelo espiritual também faz parte da rotina do marceneiro Fabiano Aparecido Maria, 44 anos, natural de Matão (SP), no interior paulista. Convertido ao Evangelho em 2013 e membro da sede estadual da Igreja da Graça no Centro de São Paulo, ele relata que sempre soube lidar com a solitude à luz da fé. “Em alguns momentos, a gente se sente só, mas sempre peço a Deus que me conforte. Estando com o Espírito Santo, é possível conviver melhor com a solidão”, afirma, revelando que lida diariamente com a pressão social, principalmente dos casados, sem se abalar. “Deus sabe de todas as coisas. Encaro esse tipo de cobrança buscando no Senhor não só respostas para os outros, mas também força para mim mesmo.”
Fabiano teve um namoro no passado, mas, ao avaliar como está a sua vida hoje, diz acreditar que o Todo-Poderoso prepara o momento certo para tudo. “Creio que existe a pessoa certa, mas o amor cristão pode ser construído a partir de escolhas. Vi muitos testemunhos na Igreja assim. Então, penso que há preparação divina e construção humana”, ressalta o marceneiro. Atualmente, o objetivo dele é estudar fora do país. “A escola já está alinhada, falta apenas o financeiro. Está nas mãos de Deus”, diz ele, citando o conselho dado por Jesus em Mateus 6.33: Mas buscai primeiro o Reino de Deus, e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas. “Enquanto isso, sigo vivendo para o Senhor”, resume.

Foto: Arquivo pessoal
Para a empresária Vera Amaral, 61 anos, a realização profissional, o cuidado com a família e a fé firmada em Cristo sempre preencheram seus dias. “Desde jovem, eu tinha o desejo ardente de ajudar a mudar a realidade dos meus pais. Sempre fui dedicada aos estudos e ao trabalho”, conta ela, que viu sua vida dar uma guinada ao realizar o sonho de conhecer o Big Ben, famoso relógio do Palácio de Westminster, em Londres. “Depois daquela viagem, passei a ser contratada para conhecer escolas no exterior. Viajei para diversos países e fundei minha própria empresa. Criei uma grande família por meio do meu ofício. Meus funcionários eram como filhos para mim.”
Durante a pandemia, Vera precisou se reinventar como empreendedora digital. Atualmente, dedica parte de seu tempo para cuidar da mãe, uma senhora de quase 90 anos. “Ela me deu a vida, e, agora, é tempo de retribuir esse amor e cuidado”, testemunha a empresária, que congrega na sede estadual da IIGD no Centro da capital paulista (SP). “Sou imensamente feliz e grata a Deus pela vida que construí e pela família que Ele me deu”, testemunha. Ela acrescenta que, ao longo dessa trajetória, a fé em Jesus desempenhou um papel fundamental. “Conhecer o caminho do Senhor me fortaleceu ainda mais. Amo Jesus, e Ele nunca me disse que, para ser feliz, eu precisava me casar”, pontua Vera, refletindo sobre seu estado civil e destacando que a pressão social não pode nem deve nortear a vida da mulher cristã. “Amo o que faço. Por isso, nunca me senti solitária ou triste por não ter me casado”, finaliza.

Foto: Arquivo pessoal
Igreja acolhedora – O desafio, porém, vai além das histórias individuais. No entendimento do Pr. Gilson Bifano, fundador do ministério Oikos, dedicado à valorização de famílias, casais e solteiros, as igrejas precisam reconhecer, urgentemente, o papel desempenhado pelas pessoas solteiras nas comunidades de fé. “Esse problema é muito comum. Nossas igrejas têm foco nos casados. As congregações ainda não perceberam que o número de solteiros está crescendo a cada dia. Tanto os casais como os solteiros são pessoas amadas por Deus e usadas por Ele para cumprir os Seus propósitos.”
De acordo com Bifano, ao longo de quase 30 anos de atuação do ministério Oikos, ele tem se dedicado a combater o uso de termos pejorativos para designar pessoas solteiras, como “encalhadas” ou “solteironas”. O pastor lembra que a felicidade não está no estado civil, e sim na comunhão com o Pai celestial. “Jesus foi solteiro, o que também é plano do Altíssimo para algumas pessoas”, observa. O ministro frisa que é necessário superar o discurso segundo o qual “adultos solteiros estão à espera de alguém”. Para ele, a Igreja deve investir nesse público. Afinal, esses indivíduos costumam ter mais tempo e liberdade para se dedicar às atividades do Reino de Deus. Ele defende que as comunidades cristãs abordem, nos púlpitos, temas sensíveis para quem vive essa fase da vida, como solidão, sexualidade, perdas e amizades – demonstrando empatia e fundamentação bíblica. “A igreja precisa ser um espaço de acolhimento, e não de cobrança”, conclui o pastor, reforçando que, à luz da Bíblia, o solteiro pode e deve viver com propósito, sabedoria, santidade e contentamento, estreitando a comunhão com Deus, cultivando dons e talentos e dedicando-se a servir ao próximo.