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Por Evandro Teixeira
Princípio de forte relevância no Antigo Testamento, o direito de primogenitura está relacionado ao prestígio do primeiro filho homem nascido em uma família. Ele não apenas recebia privilégios, mas também assumia responsabilidades que o distinguiam dos demais irmãos. Além disso, havia um peso espiritual e social, reforçando as ideias de continuidade familiar e bênção divina. Entre os principais benefícios, destacavam-se a porção dobrada da herança do pai e o reconhecimento do primogênito como líder natural da família. Essa prerrogativa está estabelecida em Deuteronômio 21.17: Mas ao filho da aborrecida reconhecerá por primogênito, dando-lhe dobrada porção de tudo quanto tiver, porquanto aquele é o princípio da sua força; o direito da primogenitura seu é. Porém, nos tempos atuais, esse direito especial perdeu sua importância em termos legais e culturais em diversas partes do mundo. Contudo, ainda tem significados e implicações em algumas famílias ou em situações específicas.

Foto: Arquivo pessoal
De acordo com o Pr. Lacir Pereira, líder estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Teresina (PI), devido à cultura judaico-cristã, base de algumas sociedades ao longo da História, especialmente na Europa e nas Américas, os valores bíblicos influenciam as formações familiares. Entretanto, ele reconhece que, hoje, o tratamento dispensado ao filho mais velho não tem o sentido legal e religioso da época dos registros bíblicos. “Nos lares modernos, a responsabilidade dos primogênitos está mais ligada à dinâmica familiar do que a uma tradição formal”, argumenta o ministro, acrescentando que, atualmente, os pais confiam ao primeiro filho mais atribuições, alimentando expectativas de que ele sirva de exemplo para os irmãos mais novos.
Citando a Palavra de Deus, Pereira lembra que Caim não teve um comportamento exemplar: movido pela inveja, matou Abel, pelo fato de Deus ter rejeitado o seu sacrifício e aceitado o de seu irmão (Gn 4.5-7). Para o líder, esses desentendimentos familiares ainda podem ocorrer, mas costumam ser influenciados pela postura de pais que deixam evidentes suas preferências por um dos filhos ou quando há disputa de direitos entre eles. “O caminho bíblico para sanar tais questões é mostrar, desde a infância, que as rivalidades geram apenas perdas.”

Foto: Arquivo pessoal
Direitos adquiridos – Embora as Sagradas Escrituras registrem o motivo que levou Caim a matar o irmão, o teólogo Martinho Lutero de Oliveira ressalta que tal conjuntura não teve necessariamente ligação com o fato de ele ser o irmão mais velho. Oliveira afirma que o conflito entre eles estava relacionado à natureza de suas ofertas ao Senhor. Isso porque Deus exigia sacrifício animal, que foi apresentado por Abel e não por Caim. Outro exemplo citado pelo teólogo é o de Esaú e Jacó. Nesse caso, o Senhor, em Sua onisciência, já havia determinado que o mais novo ficaria à frente do mais velho: E o SENHOR lhe disse: Duas nações há no teu ventre, e dois povos se dividirão das tuas entranhas: um povo será mais forte do que o outro povo, e o maior servirá ao menor (Gn 25.23). O estudioso esclarece que, como a primogenitura era destinada exclusivamente ao homem, se o primeiro filho fosse uma mulher, os pais teriam de esperar o nascimento de um menino para oficializar esse direito. “Essa era uma forma de proteção e cuidado para com as mulheres, já que essa bênção trazia grandes responsabilidades, como a ida para a batalhas e o trabalho para sustento da família”, explica.

Foto: Arquivo pessoal
Ao abordar também a questão de Esaú e Jacó, o teólogo Josenildo Cardoso Cavalcante, da Assembleia de Deus em Campina Grande (PB), afirma que a decisão do Senhor de colocar o mais novo sobre o mais velho se deu porque o primeiro filho não valorizou os benefícios da primogenitura, ao vendê-la para suprir uma necessidade imediata e passageira, conforme descrito na Palavra: Então, disse Jacó: Jura-me hoje. E jurou-lhe e vendeu a sua primogenitura a Jacó. E Jacó deu pão a Esaú e o guisado das lentilhas; e ele comeu, e bebeu, e levantou-se, e foi-se. Assim, desprezou Esaú a sua primogenitura (Gn 25.33,34). “Esaú desprezou o seu direito. Mesmo sendo um mandamento, ele não deu importância. Então, foi passado para Jacó.”

Foto: Arquivo pessoal
Cavalcante cita uma curiosidade: o benefício de a primogenitura ser destinado aos homens chegou a ser reconsiderado. De acordo com a Bíblia, havia um homem em Israel chamado Zelofeade, o qual morreu deixando apenas cinco filhas como herdeiras (Nm 27.1-8). “Pela lei, elas não poderiam herdar as terras do pai”, relata o estudioso. Entretanto, acrescenta Cavalcante, elas foram até Moisés reivindicar esse direito. E, depois de consultar a Deus, o patriarca trouxe a resposta de que era justo que elas recebessem a herança: E falarás aos filhos de Israel, dizendo: Quando alguém morrer e não tiver filho, então, fareis passar a sua herança a sua filha (Nm 27.8). “É como se abrisse uma concessão na lei civil de Israel para quando nascessem apenas mulheres na família. Mas a ordenança do Criador continuava. Em outras palavras, se uma filha nascesse primeiro e, depois, um filho, era ele quem teria direito à bênção da primogenitura.”

Foto: Arquivo pessoal
Famílias modernas – Ao contextualizar com a realidade contemporânea, o Pr. Sergio Leoto, membro da Igreja Batista Memorial de Alphaville do Alto da Lapa, em São Paulo (SP), reafirma o entendimento de que muitas famílias são influenciadas pelo conhecimento das Escrituras Sagradas. Nessa perspectiva, é fundamental seguir a Palavra e buscar garantir a harmonia entre os filhos. “Por mais que não admitam publicamente, há preferência por determinado filho em muitos lares, e acontece o mesmo no vínculo deste com seus pais”, pondera Leoto, explicando que, na prática, não seria propriamente uma predileção, mas maior afeição – embora o amor seja igual para com todos. Segundo Leoto, essa condição, de maior ou menor proximidade, pode ser gerada pelo tempo de convivência, por afinidades pessoais e pela qualidade da comunicação, por exemplo.

Foto: Arquivo pessoal
Primogênito, o rodoviário Wagner Serrano Gomes, 57 anos, tem dois irmãos mais novos. Casado com a agente de saúde Márcia Rodrigues Gomes, 55, é pai de Jéssica, hoje com 32 anos. Embora seja o mais velho, Wagner afirma que seus pais – o aposentado Walter Ferreira Gomes, agora com 79 anos, e a dona de casa Evanilda Serrano Gomes, 73 – procuraram dar o mesmo tratamento a todos os filhos, distribuindo igualmente as responsabilidades. Há dois anos, seu pai foi diagnosticado com Alzheimer [doença neurodegenerativa que causa a deterioração da memória e do pensamento]. A partir de então, Wagner passou a ser o braço direito de sua mãe. “Estou sempre ao lado deles. Ajudo a minha mãe a cuidar do meu pai e penso também nas necessidades dela. E temos lidado bem com a situação, sempre mantendo um bom diálogo”, compartilha Wagner, membro da Igreja Batista Central de Vista Alegre, em São Gonçalo (RJ).

No caso da assistente administrativa Tâmara Nascimento Pinto, 43 anos, sua condição de filha mais velha sempre ficou bastante clara: a ela foram atribuídas muitas responsabilidades por parte de seus pais – José Cassimiro Nascimento, falecido aos 70 anos, em maio de 2024, e a dona de casa Evany Pinto Nascimento, 67 anos. Tâmara cuidava da casa e dava bastante assistência à sua mãe, estabelecendo, assim, um forte elo emocional, mesmo depois de ter se casado com o empreiteiro Luciano Ribeiro Pinto, 45 anos, com quem tem três filhos. Porém, com a morte de seu pai, seus deveres familiares aumentaram. “O falecimento dele evidenciou que havia algumas lacunas emocionais em mim”, compartilha Tâmara, assinalando que, esse momento lhe trouxe força, resiliência e capacidade de administrar diferentes áreas de sua vida.

Foto: Arquivo pessoal
Chamado divino – Para o Pr. Leandro Januário da Silva, da Quarta Igreja Batista de Austin, em Nova Iguaçu (RJ), na Baixada Fluminense, o direito à primogenitura no Antigo Testamento, embora respeitado, não era seguido de maneira absoluta. “Entre Esaú e Jacó, a escolha de Deus não se prendeu à idade. Davi, por exemplo, foi ungido rei em vez de seus irmãos mais velhos (1 Sm 16.11,12). Tais acontecimentos evidenciam que a vontade do Senhor se sobrepunha ao estabelecimento da lei.”
Nesse sentido, ao avaliar as famílias da atualidade, o ministro batista afirma que, com o falecimento dos pais, os filhos mais velhos costumam exercer papéis de grandes responsabilidades na liderança familiar. Mas pensa que, independentemente da idade, é necessário saber qual deles estaria mais capacitado para cumprir essa função. No entanto, esclarece que, quanto ao cuidado dos pais idosos ou doentes, as Escrituras deixam claro que é uma tarefa de todos os filhos, sem distinção de idade. “A Bíblia diz: Honra a teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o SENHOR, teu Deus, te dá (Êx 20.12). Portanto, a função deve ser dividida entre os irmãos, seguindo as capacidades e condições de cada um”, observa o pastor, acrescentando que, nos tempos atuais, em se tratando inclusive de sucessão para assumir negócios familiares ou a liderança ministerial, é necessário focar a capacitação, o caráter e o chamado divino, e não apenas a ordem de nascimento. “É essencial estender esse tratamento às mulheres. Mesmo não sendo mais velha, muitas são competentes para ocupar cargos de liderança”, frisa.

Foto: Arquivo pessoal
O Pr. Azer Duarte Junior, da Igreja Batista Central em Andrade Araújo, na cidade de Belford Roxo (RJ), na Baixada Fluminense, lembra que Deus trata todos os cristãos da mesma forma, independentemente de gênero e idade. De acordo com ele, no núcleo familiar, o tratamento deve ser igual e seus membros precisam agir conforme a vontade do Todo-Poderoso. “Todas as escolhas e decisões têm de refletir a soberania do Altíssimo”, prega.

Foto: Arquivo pessoal
Já a Pra. Sarah Araújo Xavier Santos, líder da Igreja da Graça em Valparaíso (GO), analisa a questão da primogenitura com base na carta de Paulo aos Colossenses, na qual o apóstolo afirma que Jesus é chamado de primogênito de toda a criação (Cl 1.15,18). “Essa mensagem mostra a posição suprema e redentora de Cristo”, destaca a ministra, explicando que, por intermédio dEle, os cristãos se tornaram filhos de Deus e, dessa maneira, receberam o direito da primogenitura, conforme registra Romanos 8.17: E, se nós somos filhos, somos, logo, herdeiros também, herdeiros de Deus e coherdeiros de Cristo; se é certo que com ele padecemos, para que também com ele sejamos glorificados. “Não podemos trocar essa bênção por um prato de lentilha”, salienta a líder, reafirmando que a primogenitura guarda um caráter comportamental, cultural e espiritual.