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Foto: lightwise / 123RF

Deus e a mente

Pesquisas na área da Neurociência têm demonstrado como a fé se manifesta no cérebro

Por Patrícia Scott

Nem mesmo os cientistas sabem exatamente como funciona o cérebro humano, mas as sondagens que buscam desvendar seus meandros têm avançado a passos largos. Entre as particularidades das áreas cerebrais que têm sido bastante estudadas nos últimos anos, está a relação entre o que ocorre no encéfalo e a capacidade humana de crer naquilo que transcende o plano físico: a fé.

Um dos primeiros pesquisadores a investigar essa relação foi o neurocientista Andrew Newberg, da Universidade Thomas Jefferson, no estado norte-americano da Pensilvânia. O cientista já se debruçou até sobre o fenômeno do dom de línguas [Leia o quadro Achados interessantes]. Em seu livro Como Deus pode mudar sua mente (no Brasil, lançado pela editora Prumo, em 2009), ele explica como a fé pode promover mudanças na neuroquímica cerebral. De acordo com o pesquisador, quanto mais alguém pensa em Deus, maiores são as alterações nos circuitos neurais, observáveis por meio de exames de imagem. Dessa forma, segundo Newberg, ao promover alterações na neuroquímica cerebral, as práticas espirituais produzem sensação de paz, felicidade e segurança, além de reduzirem sintomas de ansiedade, depressão e estresse. “Esse estudo pontua que Deus pode modificar o cérebro. Se você O considerar por tempo suficiente, algo surpreendente acontecerá. O funcionamento neurológico é modificado”, afirma a psicanalista e neurocientista Rosinete Siqueira.

A psicanalista e neurocientista Rosinete Siqueira afirma: “Esse estudo pontua que Deus pode modificar o cérebro. Se você O considerar por tempo suficiente, algo surpreendente acontecerá”
Foto: Arquivo pessoal

Siqueira pontua que a mente humana foi projetada para crer em algo superior e infalível, com as mesmas características do Criador. “Podemos validar que somos corpo, alma e espírito. Se o homem tem a ‘assinatura’ do Senhor no DNA, o alimento do espírito nada mais é do que se relacionar com Ele”, ensina a neurocientista, assinalando que alguns pontos já são bastante evidentes para os estudiosos. Um deles, cita, é a frequência aos cultos, a qual reduz a evolução de doenças físicas e mentais em pelo menos 50%. Ela também lembra que a prática da oração, além de diminuir o estresse, acentua os valores éticos. “A fé norteia as crenças e os propósitos da existência, tornando assim o ser humano mais forte e capaz de enfrentar as objeções da vida”, constata.

Inteligência espiritual – O teólogo e neuropsicólogo Paulo Maurício Peixoto adverte que a ciência é incapaz de provar se o Senhor existe ou não, mas a fé é algo real para os pesquisadores. “Os efeitos dela sobre o cérebro são perfeitamente visíveis a cada situação vivenciada”, testemunha Peixoto, ressaltando que, na verdade, o homem tem a necessidade de sentir-se conectado com Deus. E, assim, a partir dessa ligação, é possível ter a fé sempre renovada e constante.

O teólogo e neuropsicólogo Paulo Maurício Peixoto testemunha que os efeitos da fé sobre o cérebro “são perfeitamente visíveis a cada situação vivenciada”
Foto: Arquivo pessoal

De acordo com o neuropsicólogo, estudos têm sugerido a existência de um ponto de Deus no cérebro humano. “Ficaria nos lobos temporais, levando o homem a buscar significado e valores para a vida. Essa área está ligada à experiência espiritual de cada indivíduo”, afirma o especialista, explicando que esse ponto de Deus no cérebro é responsável por gerar a inteligência espiritual, ou seja, a aptidão que a pessoa desenvolve de direcionar seus pensamentos, valores e comportamentos ao Senhor. “Ela sabe com exatidão, por exemplo, por que deseja a presença de Deus”, exemplifica.

O psicólogo canadense Michael Persinger (1945–2018) era outro estudioso do tema que defendia a tese da existência de uma área específica para o agir de Deus no cérebro. “Ele chegou a criar uma proteção para a cabeça para realizar análises das atividades cerebrais, e deu a ela o nome de capacete divino”, informa o teólogo Tiago Santos, especialista em Antigo e Novo Testamentos, lembrando que já existe um campo de investigação específico que estuda os processos cognitivos os quais produzem experiências religiosas e espirituais: a Neuroteologia. “O objetivo é descobrir como surgem tais manifestações nos indivíduos e quais são os benefícios.”

O teólogo Tiago Santos lembra que já existe estudo dos processos cognitivos os quais produzem experiências religiosas e espirituais: a Neuroteologia
Foto: Arquivo pessoal

Por outro lado, o teólogo lembra que os pesquisadores contrários a esse entendimento estão fundamentados na certeza de que Deus é superior e não pode ser localizado fisicamente dentro do homem. “Tentar achar uma área responsável pela fé, de acordo com esses estudiosos, seria tentar encontrar o Senhor fisicamente dentro do homem”, explica Tiago Santos, o qual acredita que Deus age inteiramente no ser humano, que deve amá-Lo de todo o coração, com toda a sua alma, todo o seu entendimento e todas as suas forças. Citando o texto escrito pelo rei Davi no Salmo 103.1 (Bendize, ó minha alma, ao SENHOR, e tudo o que há em mim bendiga o seu santo nome), o estudioso assinala ser possível que algo sobrenatural ocorra no cérebro humano quando está em contato com Deus. “O Senhor habita no corpo dos Seus servos.”

O Pr. Luiz Cláudio Gomes Lopes, teólogo e mestre em Ciências da Religião, frisa: “É importante não confundir fé e espiritualidade com religiosidade”
Foto: Arquivo pessoal

Fé e religião – O Pr. Luiz Cláudio Gomes Lopes, teólogo e mestre em Ciências da Religião, informa que, de acordo com a Bíblia, a mente – ou seja, a razão, o intelecto – é a porta de entrada para a fé. “É importante não confundir fé e espiritualidade com religiosidade”, frisa o teólogo, explicando que a religião se estrutura sobre três pilares principais: a crença em dogmas ensinados, a conduta moral aceitável pela sociedade e a participação nos rituais propostos. “Ser religioso é, em última análise, cumprir ordenanças impostas por um sistema que se arvora à comunicação metafísica.” [Do editor: Metafísica é a área que estuda e tenta explicar as principais questões do pensamento filosófico, como a existência do ser, a causa e o sentido da realidade, e os aspectos ligados à natureza]

Para os religiosos, frisa Lopes, somente a partir da observância de seus dogmas, o indivíduo tem acesso a Deus. “Já a fé e a espiritualidade estão ligadas a relacionamento, seja com o metafísico (a divindade) seja com o físico (seres humanos e natureza). Enquanto a religião detém a forma, prioriza métodos e busca o controle, a fé se conecta ao outro, gera harmonia e compreensão e se baseia no amor”, compara.

Foto: natalia0103 / 123RF

Luiz Lopes esclarece que a religião, sozinha, não consegue satisfazer integralmente o ser humano, e lembra que somente a fé e a espiritualidade são capazes de fazer do indivíduo uma pessoa melhor. “A religião pode levar a pessoa à fé, mas a fé sempre transcenderá à religião”, assegura o teólogo, assinalando que a experiência da boa, perfeita e agradável vontade de Deus, citada pelo apóstolo Paulo em Romanos 12.2, só é possível mediante uma mente transformada, expandida e preparada para se desenvolver.

O pastor lembra que o Altíssimo formou os seres humanos dotados de espírito para a comunicação entre Criador e criatura poder ser estabelecida. “Na criação, o Senhor soprou sobre as narinas de Adão o fôlego de vida, que, no original, é espírito. Talvez seja essa a identidade entre Deus e a humanidade que a instigue a uma busca frenética por fé e religiosidade”, especula.

O Pr. Victor Martins lembra que a fé é gerada pela experiência com o Senhor: “Não é uma voz na mente, mas algo que toca profundamente o coração humano”
Foto: Arquivo pessoal

Na compreensão do Pr. Victor Martins, líder estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) no Rio Grande do Sul, a fé é gerada pela experiência com o Senhor. “Não é uma voz na mente, mas algo que toca profundamente o coração humano”, explica, citando o exemplo de Abrão quando ele ainda não havia tido seu nome mudado para Abraão, em Gênesis 12.1 (Ora, o SENHOR disse a Abrão: Sai-te da tua terra, e da tua parentela, e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei). “Sem saber para onde iria, ele deixou a sua parentela. No entanto, conhecia Aquele que o dirigia”, ensina o pastor, esclarecendo que a experiência do patriarca bíblico não era algo restrito à mente, mas vinha do coração, que, no seu entender, é o espírito. “Quando temos convicção e experiências, sabemos a quem devemos seguir”, observa Martins, assinalando que “a religião é o homem em busca de Deus, mas a fé é o Senhor procurando o indivíduo e alcançando o homem”.

Para o líder estadual, pode haver uma explicação lógica sobre religiosidade e fé, mas ele não acredita que o Senhor opere dentro dessa perspectiva humana, pois o Criador é Deus de Palavra e de relacionamento. “Muitas vezes, temos de ir contra o que pensamos ser certo, justamente para realizar o que realmente é o correto aos olhos do Pai. O cérebro humano deve ser completamente do Altíssimo”, conclui o pastor, fazendo coro com o ensino de Paulo registrado em 1 Coríntios 2.16: Porque quem conheceu a mente do Senhor, para que possa instruí-lo? Mas nós temos a mente de Cristo.

Achados interessantes

As investigações no campo científico relacionadas à espiritualidade têm revelado diversos achados. Em um deles, o neurocientista norte-americano Andrew Newberg captou imagens do cérebro de cinco mulheres evangélicas, mentalmente sadias e frequentadoras assíduas da igreja delas, enquanto falavam em línguas, fenômeno também conhecido como glossolalia.

O neurocientista norte-americano Andrew Newberg Foto: Divulgação / Inner Change Documentary

O pesquisador e sua equipe perceberam pouco fluxo de sangue, ou seja, uma baixa atividade no lobo frontal, região responsável pela produção da linguagem verbal. “A queda do fluxo sanguíneo na região enquanto falavam em línguas coincide com a experiência das pacientes examinadas, que sentem não ter controle sobre suas vocalizações”, explicou, em entrevista exclusiva à Graça/Show da Fé, publicada em nossa edição nº 92 (de março de 2007).

O psiquiatra francês Boris Cyrulnik Foto: Divulgação

Já o psiquiatra francês Boris Cyrulnik, autor do livro Psychothérapie de Dieu (Psicoterapia de Deus, em tradução livre), observa que os estudos recentes têm demonstrado que a prática da oração e a vivência de outras experiências emocionais relacionadas à fé ativam uma área específica do cérebro: os lobos pré-frontais, aqueles conectados ao sistema límbico, formado por áreas onde são processadas memórias e emoções (muito estimuladas na infância). Como consequência, afirma Cyrulnik, as experiências religiosas vividas pelas crianças deixam uma marca biológica no cérebro. Assim, quando o pequeno é exposto regularmente à experiência da oração, da frequência à igreja ou a outras práticas relacionadas à fé, isso imprimirá memórias relacionadas a emoções positivas no cérebro, as quais ficarão marcadas na mente do indivíduo por toda a vida, ainda que ele perca a fé completamente quando adulto. (Fontes: One Christian Voice e Graça/Show da Fé)


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