Medicina e Saúde – 256
01/11/2020Juventude
01/11/2020Força motriz
Investir na vida espiritual dos jovens é uma preocupação central das lideranças evangélicas
Por Evandro Teixeira
O conceito de departamentalização, próprio da administração de empresas, está presente nas organizações e vem sendo aplicado na gestão eclesiástica. Qualquer igreja, por menor que seja, tem setores específicos – em alguns casos, definidos pela faixa etária dos membros que deles fazem parte, como os ministérios de crianças e de jovens. Cada área requer atenção e impõe atividades próprias às suas necessidades. No entanto, certos setores podem exigir mais cuidado da liderança, como é o caso da juventude. Foi o que mostrou um levantamento divulgado pelo instituto de pesquisas norte-americano Barna Group. Por meio da investigação, os analistas queriam saber quais seriam os principais desafios da Igreja na atualidade. Centenas de pastores, de diversas partes dos Estados Unidos, foram ouvidos, e mais da metade dos entrevistados (56%) destacou que alcançar os jovens está entre suas maiores inquietações.
Futuro da Igreja – Para a pedagoga Sandra dos Santos Pinto da Conceição, 51 anos, o resultado da pesquisa não chega a ser uma novidade, embora mereça a atenção das lideranças cristãs nos EUA e de outros países como o Brasil. De acordo com ela, a preocupação constatada no levantamento é legítima e deve ser trazida para a nossa realidade. Diretora do Departamento de Educação Religiosa Cristã e professora dos adolescentes na Escola Bíblica Dominical da Igreja Batista Herança da Graça, em São Gonçalo (RJ), Sandra da Conceição acredita que os jovens realmente são o futuro da Igreja. Ela lembra ser necessário que os obreiros mais velhos cedam espaço aos mais novos, com o passar do tempo.
No entanto, a especialista teme pelo amanhã dos moços e das moças que deixam os caminhos do Senhor para se envolver com as coisas mundanas, inclusive com a criminalidade. “Eles estão se perdendo. Muitos que foram criados por famílias cristãs têm se desviado da fé.” Com mais de 20 anos de experiência com jovens, Sandra defende que as iniciativas voltadas para esse grupo devem ter uma sólida base na Palavra. “A falta de profundidade no estudo das Escrituras faz com que eles fracassem no caminho ou tomem atitudes prematuras ao se preparar para o serviço cristão.”
O Pr. José Wellington Bezerra da Costa Neto, presidente do Conselho Nacional da Juventude das Assembleias de Deus no Brasil, concorda com a pedagoga. Em sua opinião, os jovens, para alcançarem a maturidade cristã, precisam ser estimulados, de forma correta, pelas lideranças desde a conversão. De acordo com o líder, cabe frisar que essa é uma fase difícil, por ser o período em que os princípios bíblicos ainda estão em fase de assimilação. “É quando, por meio do Espírito Santo, os antigos hábitos estão sendo mudados”, destaca o pastor, reafirmando a centralidade do discipulado.
Costa Neto reconhece que a maneira de lidar com a juventude depende do perfil de cada denominação. “As comunidades cristãs mais modernas já nascem com uma estrutura, em alguns casos, quase completamente voltada para o público jovem.” Por outro lado, ele lembra que as igrejas mais tradicionais tendem a ter uma estrutura litúrgica bem definida e menos adaptável às formas de culto que agradam aos mais novos. O pastor entende que essas congregações precisam fazer um esforço maior na elaboração de ações que atendam às demandas juvenis.
Segundo José Wellington, independentemente da maneira como os cultos são organizados, os jovens devem ser estimulados a ingressar na seara do Mestre tão logo estejam preparados. “Mesmo correndo o risco de cometer erros, devem ser incentivados a se envolver na obra de Deus.” Para que isso aconteça, a juventude precisa identificar sua vocação e ter oportunidade para desenvolvê-la.
“Viver em santidade” – O Pr. Eber Ventura dos Santos, 41 anos, membro da Assembleia de Deus em Petrópolis (RJ), também entende que os primeiros passos constituem um momento difícil para o jovem na caminhada cristã e lembra que, passada essa fase de descobrimento da fé, surge outra questão. “A manutenção de uma vida fervorosa se torna um desafio constante para quem quer andar em santidade”, assinala Santos. Citando 1 João 2.14 (Eu vos escrevi, pais, porque já conhecestes aquele que é desde o princípio. Eu vos escrevi, jovens, porque sois fortes, e a palavra de Deus está em vós, e já vencestes o maligno), ele destaca que, por ser uma força motriz da Igreja, a juventude precisa ser bem cuidada.
Na opinião desse líder, para formar jovens vigorosos e engajados espiritualmente, é preciso estruturar um ministério focado em estratégias próprias e com liberdade de ação. Um dos caminhos encontrados pela igreja dele foi o desenvolvimento de estudos ministrados por meio do ambiente virtual, dos quais os jovens são estimulados a participar ativamente, expressando suas opiniões sobre os temas debatidos. Além disso, a liderança também dá oportunidade aos que desejam desenvolver-se nas áreas da música e da ministração da Palavra.
Por sua vez, a teóloga Jenilce dos Santos Reis da Silva, 45 anos, membro da Igreja Metodista em Vila Colonial, em Paraty (RJ), destaca um ponto forte da juventude atual: a facilidade de lidar com um mundo cada vez mais tecnológico e alcançá-lo com o Evangelho. Por isso, ela entende que, além de alcançar e discipular esse grupo, é necessário agir junto às crianças. “A aplicação de recursos e a preocupação em ter uma mocidade madura na fé devem ter início na infância. Assim, os pequenos, se bem direcionados, vão se tornar adultos plenos no Reino de Deus”, assegura.
Engrenagem de carro – O estudante Ryan Sardinha Nogueira, 17 anos, destaca que todas as idades carecem de um olhar especial das lideranças, para que possam ser alcançadas e amparadas. “Sem isso, podemos gerar um crescimento desigual da igreja”, observa o jovem e presidente do grupo missionário de adolescentes da Igreja do Evangelho Quadrangular em Campos dos Goitacazes (RJ). Ele entende que a departamentalização é importante, pois ajuda a liderança eclesiástica a compreender melhor as necessidades de cada setor. O estudante lembra que a divisão do trabalho é um princípio bíblico registrado em Êxodo 18.21, quando Jetro dá o seguinte conselho a Moisés: E tu, dentre todo o povo, procura homens capazes, tementes a Deus, homens de verdade, que aborreçam a avareza; e põe-nos sobre eles por maiorais de mil, maiorais de cem, maiorais de cinquenta e maiorais de dez.
O Pr. Edclécio Bezerra Vital, 32 anos, líder de jovens na sede estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus em Belo Horizonte (MG), também acredita que todos os ministérios são essenciais. Entretanto, compara o departamento dos moços e das moças à engrenagem de um carro. “Quem desejar força e velocidade deve investir neles”, destaca. Em sua igreja, um dos canais mais usados para estimular a juventude são as redes sociais, por meio de vídeos, mensagens, lives e propósitos de oração. “A participação deles tem crescido. O mais gratificante é recebermos os testemunhos daqueles que, mesmo distantes, são alcançados e têm se fortalecido no Senhor mediante esse trabalho.”
No início, ele enfrentou dificuldades para se adaptar ao ambiente digital. Hoje, porém, entende ser esse o lugar ideal para atingir os jovens. Edclécio Vital lembra que a obra de Deus não pode parar. Por isso, todo líder precisa instrumentalizar os continuadores do ministério. O pastor lembra que as igrejas de hoje são fruto do empenho de crentes do passado, os quais pagaram um preço na preparação de seus sucessores.
Vital destaca que esse esforço na formação dos mais jovens requer perseverança, porque os moços podem tropeçar e cair ao longo da jornada com Cristo. “Todos somos provados. É como fazer um curso e se preparar para a prova. Isso acontece ao longo da caminhada. O mais importante é não desistir”, pontua o líder, lembrando que o próprio apóstolo Pedro teve percalços neste mundo. “Ele negou Jesus, mas seguiu em frente e se tornou um dos maiores pregadores da história do Evangelho.”