Família – 255
01/10/2020Vida Cristã
01/10/2020Conhecendo a verdade
Aprender que as experiências ruins também fazem parte da vida é essencial para a formação das crianças
Por Ana Cleide Pacheco
Proporcionar aos filhos uma boa criação, blindando-os de problemas, está entre as preocupações dos pais. No entanto, por mais que os responsáveis se esforcem, não conseguem evitar determinados eventos. A pandemia do novo coronavírus, que assolou o mundo, é um exemplo. De repente, o cotidiano das famílias mudou completamente: isolamento social, desemprego, doença e morte começaram a fazer parte da rotina de milhões de lares.
Especialistas em Psicologia da Infância e Adolescência ensinam que os pequenos precisam entender que, na jornada humana, há períodos complicados. Portanto, trabalhar as emoções desde cedo é fundamental. Reconhecê-las vai auxiliá-los na compreensão de diferentes situações, além de proporcionar um maior entendimento de seus sentimentos, escreveu a psicóloga Jenifer Pinno, em artigo postado no portal virtual Mundo Psicólogos.
Porém, nem sempre é fácil tratar de temas espinhosos com as crianças, como lembra a Pra. Giovana Onofre, vice-líder do ministério Mulheres que Vencem na sede regional da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Ipatinga (MG). Entretanto, ela defende que meninos e meninas devem ser esclarecidos sobre a realidade ao seu redor: “Não podemos pintar um mundo perfeito só para tentar protegê-los”.
Mãe de três crianças, Giovana ressalta que a base de todo esse direcionamento tem de ser o Livro Sagrado. “Mesmo sendo cristãos, podemos nos defrontar com momentos ruins. O Senhor deixou claro que poderíamos passar por tribulações”, observa, citando o texto de João 16.33: Tenho-vos dito isso, para que em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo; eu venci o mundo. De acordo com a líder, os pais cristãos devem mostrar aos filhos que, por meio da fé, pode-se superar qualquer crise. “O Altíssimo ouve e responde às nossas orações, seja por uma simples dor seja por algo aparentemente sem solução.”
“Compreensão infantil” – O pastor e jornalista Billy Fádel Machado Rampinelli, da Igreja Metodista em Ubá (MG), destaca que as crianças não saberem explicar determinadas questões não significa incompreensão. “Elas são mais sensíveis que os adultos e possuem uma percepção mais apurada”, diz. Ele reconhece, porém, que as expressões e os comportamentos delas são reflexos do que aprendem observando as reações dos adultos, principalmente em seu núcleo familiar.
Rampinelli alerta para o perigo de alguns recorrerem a mentiras a fim de proteger os filhos. “Existem diversas formas de relatar um acontecimento. Que a verdade seja dita dentro da compreensão infantil.” Para aqueles que creem no Evangelho, frisa o jornalista, a fé cristã será “um gerador da esperança” que sustentará e motivará a família em meio às turbulências. “Não ter essa compreensão, além de não ajudar no amadurecimento, significa não dar sentido à vida”, comenta Fádel. Ele acrescenta que, por falta de aprendizado nessa área, vários jovens, não sabendo lidar com as emoções, podem, em casos gravíssimos, cometer suicídio.
Por isso, a dona de casa Francisca das Chagas Pereira da Silva, 43 anos, costuma manter conversas francas com seus dois filhos. “Se não lhes mostrarmos os fatos, corremos o risco de transmitir para eles uma visão errada do mundo”, observa ela, membro da Igreja da Graça em Indaiatuba (SP). Segundo Francisca, é importante a criança crescer ciente de que os empecilhos também fazem parte da vida. “Reconhecer isso não significa falta de fé, e sim uma atitude que ajudará no desenvolvimento de sua maturidade.”
Para a psicóloga Rafaella Pinheiro Belarmino de Matos, assuntos relativos ao sofrimento devem suceder por meio de um diálogo fundamentado no amor e no respeito às autoridades devidamente reconhecidas, como pai, mãe, instituições e governantes. “Os pais são responsáveis pela formação do arcabouço psicológico dos filhos, e um núcleo familiar alicerçado nos princípios bíblicos consegue articular esses temas com mais tranquilidade.” Do ponto de vista da especialista, a família cristã se posiciona sem medo diante dos percalços. “Por confiar em Deus, não subtrai dos filhos o entendimento acerca das dificuldades e seus possíveis desdobramentos.”
Ela esclarece que o desenvolvimento psicológico do pequenino ocorre em etapas e ele tem a personalidade formada por volta dos sete anos. Contudo, não é necessário esperar até essa fase para começar a falar sobre as agruras pertinentes à existência humana. “As conversas sobre sofrimento, por exemplo, devem acontecer naturalmente, conforme a criança cresce, desenvolve-se e forma sua personalidade”, orienta ela, membro da IIGD em Indaiatuba.
Desenvolvimento mental – A psicóloga clínica Sandra Helena Moura da Silva, da Assembleia de Deus em Oswaldo Cruz, zona norte do Rio de Janeiro (RJ) considera indispensável forjar nos pequenos o senso de realidade. Mas, embora concorde que eles têm capacidade de assimilar o sentimento de dor, faz um alerta: o problema, em si, não deve ser demasiadamente valorizado. “A complexidade dessas questões pode ser explicada de forma lúdica”, informa, advertindo que essa aprendizagem não deve ser vista pelas crianças como algo desagradável.
A pastora e psicopedagoga Maria de Fátima da Costa Pereira, da Igreja do Evangelho Quadrangular em Bangu, zona oeste carioca, assinala que os genitores devem ter o cuidado de adaptar a linguagem para os pequenos. “Eles precisam de exemplos concretos para absorver melhor os assuntos apresentados”, ensina.
Mesmo ciente de que a responsabilidade máxima pela formação dos filhos compete aos pais, a profissional reconhece a relevância de todos os agentes que, de maneira indireta, atuem na educação das crianças, como familiares e professores. “No entanto, convém que sejam indivíduos equilibrados, que estejam interessados no desenvolvimento mental, emocional, social e espiritual delas”, alerta. A psicopedagoga ainda lembra que falar acerca de sofrimento não agrada à maioria das pessoas. “Diante de uma situação real de dor, o ser humano busca, de imediato, saídas para amenizá-la. Porém, o impacto é menor nas emoções daqueles que foram orientados biblicamente a respeito desse sentimento.”
Essa orientação deve levar em conta, entre outros aspectos, que a Bíblia não oferece ao cristão imunidade à dor, como salienta o Pr. Reinaldo Vieira Lima Júnior, da Igreja Batista 21, em Santana, zona norte de São Paulo (SP). “A Palavra relata histórias de sofrimento de pessoas cheias de fé e fiéis ao Senhor, como Jó, que, mesmo perdendo filhos e bens, manteve-se firme.” O pastor acrescenta que o próprio cristianismo tem suas bases na maior história de sofrimento: a crucificação. “Além disso, para o Evangelho chegar até os dias de hoje, muitos servos de Deus padeceram e morreram.”
Lima Júnior reconhece que os dissabores da vida exigem discussões complexas, em especial na infância. No entanto, destaca que ninguém deixará de sofrer, seja adulto seja criança, simplesmente por ignorar essa realidade. Em sua opinião, aprender a enfrentar os desconfortos é crucial para a saúde mental de qualquer um. “A elaboração e a reflexão a respeito desse tema nos ajudam a lidar com nossas dores e lutos por perdas significativas”, conclui.