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01/07/2020EXAME CRÍTICO DA TEOLOGIA LIBERAL
Na edição passada, falamos dos principais pensadores do liberalismo teológico. Neste exemplar, vamos analisar a teologia liberal.
A partir de meados do século 19, como consequência da grande vitalidade intelectual e reorientação do pensamento, nasceu a corrente do liberalismo teológico. Foi aquela uma época de renascimento religioso em geral e, em particular, de expansão do protestantismo – institucional e geograficamente – caracterizada pelas missões e pelo surgimento das sociedades bíblicas.
O liberalismo teológico, em sua essência, procura libertar as consciências cristãs das suas amarras escolásticas, apontando-lhes as exigências da razão. Realça a pessoa de Deus como a Fonte de toda a verdade e enfatiza a necessidade de uma certeza sincera na busca desta, embora reconheça a impossibilidade de o ser humano alcançar um conhecimento pleno da verdade absoluta.
Para Platão (428-347 a.C.) o intelecto tem ideias supersensíveis, inexplicáveis à luz da razão, sendo que é nesse reino que residem as marcas principais e distintivas da alma humana. Modernamente, é cada vez maior o número dos que conhecem uma área essencialmente metafísica, fora do alcance dos meios físicos portanto, na qual o espírito obedece às leis de sua própria natureza.
Segundo os teólogos liberais, o protestantismo precisa incorporar à sua teologia os valores básicos, as aspirações e as atitudes atribuídos à cultura moderna, ressaltando, entre outros, o imperativo ético do Evangelho. Dessa pregação, nasceu o evangelho social. Nele, a mensagem de Cristo deixa de ser o poder de Deus para a salvação e regeneração do homem e se torna apenas uma fórmula social, impotente.
A Igreja transcende as fórmulas humanas. Ela produz aquela vida plena de riqueza, que é o espírito livre e nobre em ação; reflete sobre os melhores pensamentos; aceita os mais elevados ideais e os reveste de uma linguagem irresistível. Assim, ela infunde um poder criador na sociedade de espíritos humanos. Não há modelo suficientemente certo para tornar boa uma sociedade, se não for executado por homens bons. O cristianismo não elabora fórmulas, e sim cria os homens capazes de inserir força moral em qualquer método.
O movimento liberalista não reivindicou apenas amplas liberdades para o exercício da razão, mas também pregou a tolerância entre as denominações protestantes, aproximando-as pela minimização das diferenças doutrinárias. O ressurgimento da intolerância religiosa no seio do catolicismo romano, nas primeiras décadas do século 19, resultou na prisão e morte de protestantes em diversos países (especialmente na Estônia, Lituânia, Letônia, Turquia, Pérsia, Portugal e Espanha). Contudo, essa situação contribuiu para aproximar entre si as denominações evangélicas. Em 1846, a organização da Aliança Mundial Evangélica, em Londres (Inglaterra), foi uma resposta ao estado de insegurança em que se achavam várias correntes do protestantismo. Essa Aliança muito fez pela liberdade de culto em todo o mundo.
Entretanto, o espírito liberal reclama ainda respeito pela ciência e pelos métodos científicos de pesquisas, o que implica a aceitação franca do estudo, tanto do mundo material como da crítica bíblica e da história da Igreja. Foi valendo-se desse estado de espírito favorável que o naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882) publicou, em 1859, a sua célebre obra A origem das espécies, provocando violentas e intermináveis polêmicas.
Abismos – O liberalismo teológico aceita também o princípio da continuidade. Este considera mais importantes as semelhanças do que os contrastes, admitindo-se a ideia da evolução para superar os abismos existentes entre o natural e o espiritual, entre o homem e seu Criador, evidenciando mais a imanência do que a transcendência de Deus. O liberalismo prega ainda a confiança do homem no futuro, gerada pelas grandes conquistas em todos os campos da ciência.
Quanto à imanência de Deus, ele sugere a ênfase de que a divindade está identificada com a totalidade das existências, afirmando, panteisticamente, que tudo é Deus e Deus é o tudo. Elimina-se, dessa maneira, toda a concepção da personalidade divina, e, em consequência, considera-se o homem um irresponsável.
Quando se nega o conceito do Altíssimo como Criador onipotente, que está acima de todos os Seus feitos, corre-se o risco de cair no fatalismo, característico dos cultos orientais, infelizmente, em expansão no Ocidente. Sinais da presença do fatalismo em nossos dias são os horóscopos, o fetichismo e, até mesmo, os biorritmos, rejeitados como anticientíficos por grande número de médicos renomados.
Ainda em relação à ênfase dada pelo liberalismo à imanência de Deus em tudo, há uma implicação séria quando se trata do problema do pecado. Despersonalizando a divindade, o homem é colocado no centro, como a medida de tudo. Isso significa que o fim do homem é estar satisfeito consigo mesmo, com seus horizontes.
O teólogo presbiteriano John A. Mackay (1889-1983) afirma que o pecado, como fator na existência humana, é terrivelmente real, e é coisa que os filósofos balconizados sempre trataram de fazer desaparecer por meio de argumentos em conformidade com a razão. A expressão balconizados era uma referência a Aristóteles (384-322 a.C.) e a Ernest Renan (1823-1892), como símbolos daqueles para quem a vida e o universo são objetos permanentes de estudo e contemplação.
Destacamos ainda outras doutrinas liberais, tais como: os credos primitivos são arcaicos e sem realidade para o mundo moderno; a mente do homem é capaz de raciocinar segundo os pensamentos de Deus; a mente deve estar aberta à verdade independentemente da fonte; as doutrinas cristãs são símbolos de verdades racionais conhecidos pela razão humana; a divindade de Jesus era uma declaração simbólica do fato de que todos os homens possuem um aspecto divino; o conceito bíblico da revelação de Deus na história era ingênuo e pré-filosófico.
Abraão de Almeida
Pastor da Igreja Evangélica Brasileira em Coconut Creek, Flórida, EUA, e autor de mais de 30 livros em português e espanhol. E-mail: abraaodealmeida7@gmail.com