Cultura & Cristianismo
15/06/2023Carta do Pastor à ovelha – 288
01/07/2023Acesso irrestrito
Especialistas discutem os perigos da exposição de crianças e adolescentes à pornografia na internet
Por Ana Cleide Pacheco
Os brasileiros começam a consumir vídeos e imagens com conteúdo sexual ainda no início da adolescência, por volta dos 12 anos. É o que mostra um levantamento realizado pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Na pesquisa, 3.650 pessoas responderam ao questionário do International Sex Survey (Inquérito Internacional sobre Sexo, em tradução livre), trabalho científico que revelou detalhes acerca do comportamento sexual da população em 45 países.
O advento da internet tornou muito mais fácil para os jovens o acesso a conteúdos impróprios. Embora nem todas as crianças nem todos os adolescentes pesquisem esses materiais, há sempre o risco de que encontrem páginas da web contendo imagens de violência ou fotos e vídeos de sexo explícito. A Pra. Aline Câmara de Souza, 41 anos, líder de jovens e adolescentes da Igreja Evangélica Fonte de Amor Eterno, na Ilha do Governador, zona norte do Rio de Janeiro (RJ), salienta que o acesso a esses conteúdos pode acontecer com pessoas de qualquer idade. “Hoje, bebês de um ano já têm algum tipo de contato com celulares, tablets e telas em geral. E, infelizmente, se um desses aparelhos foi usado por alguém que acessou um site com pornografia, ou recebeu fotos ou vídeos de cunho sexual, é possível que a criança tenha contato com esse conteúdo.”
A pastora lembra que os pequenos geralmente são muito curiosos, por isso é necessário que os pais, ou outros cuidadores, tenham a preocupação de resguardá-los dos perigos contidos no mundo virtual. “Em muitos casos, a facilidade de acesso se dá pela falta de vigilância por parte dos responsáveis. Muitos sequer sabem o que os filhos fazem na internet”, alerta a ministra, acrescentando que a sexualidade tem sido despertada precocemente por diversos meios, tais como músicas, filmes, séries, desenhos animados e redes sociais, como o TikTok. “Em qualquer lugar, vemos crianças e adolescentes fazendo dancinhas sensuais para postar em seus perfis. Por isso, faço um alerta aos pais: cuidado com as fotos e os vídeos que seus filhos postam com alguma conotação sexual. Eles podem estar sendo usados, editados e transformados em pornografia infantil.” [Leia, no final desta reportagem, o quadro Rede de proteção]
Outras fontes – A especialista em Educação Sexual Tainá Bittencourt Gondim, 38 anos, afirma que a prevenção é a melhor forma de proteger a formação sexual e emocional dos pequenos. Segundo ela, as informações sobre o tema [sexo] devem ser ministradas de maneira intencional – formal e informalmente – em casa e no dia a dia de cada família e nos ambientes de educação acadêmica e religiosa. “Da mesma maneira que os pais oferecem educação escolar e espiritual, a educação sexual e emocional devem ser consideradas. Não podemos esperar que a criança pergunte sobre sexo e sexualidade para, então, responder às questões dela.”
De acordo com Gondim, os pequeninos são cientistas inatos e, por tal razão, procuram desvendar os mistérios de tudo que os circunda. “E isso desde a natureza, os animais, as plantas, os alimentos, os relacionamentos, as emoções e até os seus próprios corpos”, elenca a especialista, lembrando que, se as dúvidas da criança não são sanadas no círculo familiar, ela buscará outras fontes. Nesse caso, é possível que as informações obtidas não sejam apropriadas para a idade dela ou não estejam de acordo com sua maturidade cerebral e emocional.
A psicóloga Patrícia Soares, 53 anos, acrescenta que, mesmo sem demonstrar qualquer interesse por pornografia, o adolescente pode se envolver com esse tipo de conteúdo por pressão dos amigos. “Apesar de muitos serem bem orientados e informados sobre autocuidado, autoamor e proteção contra abusos, a maioria acaba cedendo para se sentir incluído ou pertencente aos grupos com os quais convive.”
Além disso, as próprias famílias podem influenciar negativamente os pequenos. É o que pensa a professora, assistente social e conselheira tutelar Dulce Helena Mota, 61 anos. Membro da Igreja Batista em Vila Nova, na cidade de Nova Iguaçu (RJ), ela enfatiza que a má influência pode ocorrer, por exemplo, quando pais, mães ou parentes próximos não se mantêm em um único relacionamento. “Acabam levando para dentro de suas casas ou para a interação familiar diferentes parceiros. E, em muitas situações, comportam-se de maneira inapropriada na frente das crianças e dos adolescentes.”
A psicóloga infanto-juvenil Rafaella Lauria Holanda, 41 anos, reitera que inúmeros fatores podem levar os mais jovens a enveredarem pelo caminho da pornografia. Na opinião dela, além dos aspectos já citados, como a facilidade de acesso a esses conteúdos, a pressão social e a falta de orientação adequada em casa, há também questões de ordem emocional. Segundo a especialista, o contato com a pornografia pode ser uma forma de o jovem lidar com a depressão, a ansiedade, o estresse, a solidão, ou mesmo com questões relacionadas à autoimagem e aos padrões de beleza vigentes. “O indivíduo pode se isolar mais e ter menos interesse em estabelecer amizades saudáveis e significativas”, destaca Rafaella, que é membro da Igreja de Nova Vida no centro do Rio de Janeiro (RJ). A profissional chama atenção também para o fato de que o consumo recorrente de material pornográfico é capaz de provocar mudanças na estrutura do cérebro, especialmente na área associada à recompensa e ao prazer. Dessa forma, “o jovem poderá desenvolver uma tolerância à pornografia e, por esse motivo, precisará cada vez de mais estímulos para obter a mesma sensação de prazer”.
Em seu livro No altar da idolatria sexual (Graça Editorial), Steve Gallagher, cita, no primeiro capítulo, alguns exemplos de pessoas que se tornaram dependentes de pornografia ainda na adolescência e levaram essa prática para a vida adulta. O autor relata a história de Bob, apresentado à pornografia pela primeira vez quando descobriu revistas de cunho sexual debaixo da cama de seu pai. Anos de escravidão se seguiram. Quando a pornografia já não o excitava mais, ele começou a andar furtivamente ao redor de casas para espiar pelas janelas. Passava horas em uma janela, esperando o vislumbre de um corpo nu. Depois de arruinar um casamento e quase fazer o mesmo com outro, Bob finalmente buscou ajuda, descreve o escritor.
Steve Gallagher, ex-dependente de pornografia e fundador do Pure Life Ministries, escreve acerca das pesadas consequências para quem passa a fazer desse comportamento um estilo de vida: Depois de o homem tornar-se um viciado sexual, entra em um ciclo vicioso de autodestruição e degradação. Parece que quanto mais compulsivo ou pervertido for seu comportamento sexual, mais severamente a sociedade vai rotulá-lo e julgá-lo por causa disso. Consequentemente, sua vida inteira é consumida pela culpa e pela vergonha.
Verdadeiro bombardeio – Quando uma criança ou um adolescente tem acesso à pornografia muito cedo, a curiosidade em relação ao sexo é despertada antes da hora, fazendo com que muitos tenham a primeira relação sexual prematuramente, quando ainda não estão maduros fisica e emocionalmente. “Isso gera problemas na vida adulta”, lembra a professora Luciana dos Santos Mendonça, 37 anos, da Igreja Metodista em Cascadura, zona norte do Rio de Janeiro (RJ), onde atua como conselheira de adolescentes com idades de 12 a 17 anos.
Luciana relata que ela mesma foi uma vítima do acesso precoce à pornografia. “Não fui criada em um berço cristão. Morávamos eu – na época, com 12 anos – minha mãe e meu irmão. Ele era um pouco mais velho, tinha 13 anos, e sempre assistia a filmes pornô”, relata a docente. Quando o garoto não estava em casa, ela assistia àqueles filmes, movida pela curiosidade, aproveitando-se da ausência de supervisão da mãe. “Aquilo não me fez bem, obviamente. Mas, graças a Deus, aos 28 anos, conheci Jesus, e agora posso falar sobre isso sem dor e traumas.”
Na opinião da professora, os adultos têm a obrigação de saber o que os jovens fazem quando estão com tempo ocioso. “Alguns pais precisam trabalhar e, por isso, não acompanham a educação dos filhos ou o que eles acessam e assistem. Falta a ‘mordomia do tempo’. É preciso que estejam atentos, que conversem com os pequenos e tirem as dúvidas deles”, sugere Luciana, acrescentando que muitos pais se desviam do tema pornografia por ser um assunto polêmico. “Ela existe, e a busca por esse tipo de material, infelizmente, está presente na sociedade. Cabe a nós, adultos e responsáveis, ensinar às nossas crianças e aos nossos adolescentes como não sucumbir a essa prática.”
O Pr. Clayton da Conceição Almeida, 30 anos, líder de jovens da sede estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) no Rio de Janeiro, acredita que as igrejas podem dar contribuições importantes para a nossa mocidade. “Elas têm o papel fundamental de nortear a vida dos adolescentes, dos jovens e dos adultos”, afirma o pregador, acrescentando que as comunidades evangélicas devem atuar no aconselhamento e no ensino da Palavra sobre o pecado e a santidade, além de indicar quais são os malefícios causados pelo consumo de material pornográfico. “Se existe um lugar de tratamento profundo contra a compulsão da pornografia, esse lugar é a Igreja. Cito, particularmente, o texto de Provérbios 22.6: Instrui o menino no caminho em que deve andar, e, até quando envelhecer, não se desviará dele.”
O pastor lembra que as crianças e os adolescentes sofrem hoje um bombardeio de informações para que cedam ao envolvimento com a pornografia, à prática da masturbação ou à iniciação sexual precoce. Almeida destaca ainda que deve haver especial atenção à questão da vulnerabilidade de rapazes e moças aos vários perigos escondidos na internet, entre eles, o contato com pedófilos. “Em minha opinião, o ideal seria que os pais só liberassem as redes sociais para seus filhos quando estes fossem maiores de 18 anos. No entanto, não é o que vemos hoje. Sendo assim, um dos caminhos para protegê-los dos riscos é que os responsáveis tenham acesso a todas as contas dos filhos. É importante que estejam sempre presentes, ensinando os princípios e valores da Palavra de Deus, fundamental no desenvolvimento emocional e espiritual dos pequenos e no combate a esses bombardeios”, conclui.
Rede de proteção
Livrar os filhos dos perigos escondidos na internet é uma tarefa dos pais. Para garantir a formação de uma rede de proteção nos lares, é preciso ter em mente algumas lições importantes:
1) Veja a tecnologia como uma arma, não como um brinquedo.
2) Utilize ferramentas de controle parental disponíveis na web para proteger os pequenos. Entre elas, estão aplicativos como o Qustodio: permite filtrar sites, definir limites de tempo de navegação, bloquear aplicativos e obter relatórios. E o Google Family Link: possibilita ver quanto tempo a criança está usando o dispositivo, compartilha a localização dela, gerencia a privacidade, entre outras opções.
3) Nunca forneça senhas de cartões que permitam a compra de conteúdo ilícito.
4) Preste atenção ao que as crianças assistem e postam nas redes sociais, como o TikTok, aplicativo que muito acessado entre os mais jovens.
5) Se o adolescente tem acesso ao celular sozinho, no quarto, à noite, há maior risco de ele acessar conteúdo pornográfico. Por isso, peça-lhe que entregue o dispositivo antes de dormir.
6) Esteja atento não só ao que o adolescente ou a criança faz on-line,observe seu comportamento em casa, na escola e no trato com as pessoas.
7) Explique ao seu filho, desde cedo, os problemas gerados pelo acesso a conteúdos impróprios.
8) Ensine seu filho acerca da santidade do corpo (Rm 6.12) e deixe claro que ele não é uma mercadoria a ser exposta nem observada por outrem, a não ser dentro do casamento.
(Fontes: Aleteia, Moral Revolution, Qustodio e Google)