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23/05/2024“Presença ausente”
Pastores e especialistas explicam como o uso excessivo das telas está afastando as pessoas
Por Ana Cleide Pacheco
Os primeiros telefones celulares eram um artigo de luxo quando foram lançados no Brasil em 1990. Mesmo chegando quase duas décadas depois em relação aos Estados Unidos, o alto custo dos aparelhos e das tarifas eram proibitivos para a maioria da população.
Passados mais de 30 anos, poucas pessoas se recordam daqueles objetos pesados, que realizavam chamadas telefônicas com dificuldade por causa da principiante rede de antenas das operadoras. Com a agilidade proporcionada pelos serviços de wi-fi, 4G e pela crescente cobertura 5G, os celulares se transformaram em uma ferramenta multifuncional: tiram fotos, gravam vídeos, abrem portas e dispensam o uso físico de cartões de crédito e débito.
Por meio dos dispositivos móveis, também é possível pedir entrega de comida, assistir às aulas da faculdade e fazer compras de supermercado. As alternativas são infinitas. A pequena tela preta, sensível ao toque, tornou-se companheira de todas as horas.
Paradoxalmente, agora, o que as pessoas menos fazem com o smartphone é telefonar. Elas preferem trocar mensagens, tornando a conversa mais fácil, conveniente e, quase sempre, brevíssima. O uso de emojis e GIFs limita ainda mais a escrita, substituindo palavras.
“Memórias afetivas” – Esse aparelho, desenvolvido para encurtar distâncias e facilitar o diálogo, está reduzindo a comunicação verbal. “É comum entrar em um restaurante e observar as pessoas com o celular nas mãos, deixando de bater um papo, olhar nos olhos e ter tempo de qualidade, desperdiçando a oportunidade de criar memórias afetivas com alguém”, destaca a pedagoga Flávia Grégio, 41 anos, membro da Assembleia de Deus de Pilares, zona norte do Rio de Janeiro (RJ).
A especialista ensina que, apesar de os celulares conectarem indivíduos que nunca se viram pessoalmente, fazer uma conexão não significa criar vínculos. “Estar conectado é ficarantenado no que acontece. Quando uma pessoa se conecta à outra, elas estão ligadas por um fio, o que é diferente de ter vínculo. Este é caracterizado por um elo que vai além da amizade virtual”, destaca. Flávia enfatiza a necessidade da comunhão, do contato direto: “Fala-se muito sobre amigos virtuais. Na verdade, eles são apenas conhecidos on-line. Banalizar a amizade é desprezar algo precioso e bíblico, um sentimento criado pelo Pai.”
A jornalista Raquel da Cunha Lucena, 41 anos, acrescenta que vínculo é conhecimento. “Não estabelecemos laços com desconhecidos”, destaca ela, especialista em Marketing Digital. De acordo com Raquel, os contatos formados via redes sociais são efêmeros e rasos. “Na internet, ressaltamos o que queremos. As pessoas não se revelam completamente nem mostram suas fraquezas. Tampouco divulgam seus defeitos. Só exibem o que gera aplausos, curtidas, projeções, ocultando sua essência, seus segredos, suas dificuldades. Existe uma troca de informações, não a criação de vínculos. Isso só acontece no convívio e na intimidade.”
Por outro lado, segundo a jornalista, é inegável que a tecnologia representa ganhos também: “Antigamente, quando as pessoas saíam, não sabíamos se estavam bem. Só tínhamos informações a respeito delas ao retornarem para casa. Usar a tecnologia a nosso favor é maravilhoso.” O problema reside na apropriação desordenada dessas ferramentas, ocasionando danos físicos e emocionais e prejudicando as amizades: “É incrível quando usamos esses recursos de maneira ponderada. Precisamos estar conscientes dessa relação.”
Conexões – O Pr. Henrique Rodrigues, 40 anos, da Assembleia de Deus na Avenida Itaoca, em Bonsucesso (RJ), faz coro com Raquel Lucena. Em sua opinião, o maior problema é a falta de equilíbrio. “Temos dispositivos cada vez mais avançados, que nos conectam também com quem nunca teríamos contato. Apesar dos benefícios, em nome de conexões distantes, muitos acabam perdendo as próximas”, avalia.
Além de pastor, Rodrigues é jornalista e sinaliza uma característica comum hoje: a “presença ausente”. Esse fenômeno social ocorre quando pai e mãe se sentam com o celular nas mãos para brincar ao lado do filho, por exemplo: “Eles estão presentes fisicamente, porém ausentes do ponto de vista emocional.” A situação se repete nos cultos. “As pessoas não levam mais a Bíblia impressa, e sim seus smartphones com um aplicativo das Escrituras, e se distraem facilmente quando percebem uma notificação de mensagem”, diz ele, pontuando que essa desatenção ocorre na igreja, em casa e no trabalho. “Para desfrutarmos das novas tecnologias, sem perdermos nossa essência de seres relacionais, precisamos de equilíbrio.”
“Mentiras do diabo” – O empresário Leonardo Rodrigues, 37 anos, sinaliza que, com frequência, as pessoas estão juntas no mesmo ambiente, porém isoladas em seu mundo digital. “Ao excedermos o uso saudável do celular, o que serviria para nos aproximar está nos afastando”, lamenta ele, assinalando que conteúdos e conversas on-line estão se sobrepondo ao contato pessoal com os entes queridos: “Não nos interessa mais como foi o dia do outro ou como está o desenvolvimento dos nossos filhos
na escola.”
De acordo com Rodrigues, muitos sabem mais sobre um blogueiro famoso do que a respeito da saúde da própria mãe. “O celular, como forma de interação social, está maquiando a essência humana, que é a comunicação face a face, a troca, as risadas e os abraços, cada vez mais raros. Precisamos resgatar isso”, conclama o empresário, membro, diácono e líder de jovens da Assembleia de Deus na Avenida Itaoca, em Bonsucesso (RJ).
A líder de adolescentes, Ana Paula Lima de Souza Caldas, 42 anos, da Igreja Lagoinha em Niterói (RJ), reforça que o uso desmedido das novas tecnologias afeta o convívio no lar. De acordo com ela, inúmeros pais perderam os rumos do próprio coração, desvirtuando a família e levando seus filhos a caminhos longe de Deus. “As novas tecnologias devem ser usadas para o bem, e não para nos alienar ou condenar à vida infrutífera de quando Jesus não é o Centro. A Igreja tem um papel primordial na restauração dos lares, mostrando a verdade do Evangelho, confrontando as mentiras do diabo e ensinando o amor do Senhor e a temperança.”
O Pr. Paulo Henrique Miranda Araújo, 51 anos, da sede estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus na Bahia, lembra que as pessoas se habituaram a conversar com os filhos, cônjuges e amigos pelas redes sociais. “Perderam o costume de olhar nos olhos e abraçar”, lamenta Araújo, assinalando que as crianças têm acesso aos aparelhos eletrônicos cada vez mais cedo, inclusive durante a fase da amamentação. “O que será dessa geração que cresce condicionada ao virtual? Da mesma forma, existem casais que vivem debaixo do mesmo teto, mas não se olham nem se cumprimentam devido ao hábito de estar apenas no celular.” Para ele, o papel da Igreja é ressaltar a advertência do apóstolo Paulo em 1 Coríntios 6.12: Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm; todas as coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma. “Eis o nosso chamado como Igreja envolvendo essa geração que tanto precisa de Cristo”, conclui.
2 Comments
Excelente trabalho que Deus abençoe i aumente muito mais
amém