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O porquê de jovens evangélicos abandonarem a comunhão com Deus e suas igrejas quando chegam à universidade
Por Ana Cleide Pacheco
I
ngressar em uma faculdade é o sonho de muitos. Conseguir uma colocação em algumas universidades pode ser difícil e exigir bastante foco nos estudos. Dependendo do curso e da instituição pretendida, ser aprovado já é uma grande vitória. Mas, assim que conquista uma vaga no ambiente acadêmico, o jovem calouro logo percebe que novas e maiores batalhas o aguardam; a cobrança por resultados satisfatórios nas avaliações é uma delas. Assim, ele entende que precisa se dedicar ainda mais às disciplinas, tendo pouco tempo livre para o lazer e outras atividades. Se estudar e trabalhar, o divertimento será ainda mais escasso.
O acesso ao nível superior coincide geralmente com o início da vida adulta – ou seja, ocorre após os 18 anos –, quando o jovem começa a ganhar mais autonomia em relação à família. Nesse contexto, com as novas amizades, surgem convites para frequentar todo tipo de lugar, inclusive aqueles que antes eram vedados pelos pais.
Enfim, essa nova etapa é marcada por inúmeras mudanças. Mas, para o cristão, tudo isso pode representar um desafio à sua fé. É o que demonstra uma pesquisa realizada nos Estados Unidos, pelo instituto Lifeway Research. Ela mostrou que 66% dos jovens adultos evangélicos norte-americanos se afastaram da igreja em algum momento entre os 18 e 22 anos; sendo assim, justamente no período do curso superior.
Na visão do professor universitário e pastor Nilton Melo, 45 anos, um cenário parecido pode ser observado entre os universitários brasileiros. Titular da Primeira Igreja Batista de Augusto Franco, em Aracaju (SE), Melo entende muito bem (de perto) o assunto: ele é assessor auxiliar da Aliança Bíblica Universitária do Brasil (ABUB), organização que visa capacitar estudantes para levar a mensagem de Cristo aos campi onde estão inseridos.
De acordo com Melo, há vários motivos que explicam por que jovens cristãos abandonam a fé na faculdade, mas, segundo ele, o principal é a falta de firmeza doutrinária e espiritual de muitos deles. O líder observa que a maioria nasceu em lares cristãos e conhece bem a “dinâmica” das igrejas, entretanto não têm comunhão e compromisso com Jesus. “Em geral, os que se desviam são aqueles que cresceram na igreja, porém não eram praticantes da fé. Assim, ao chegarem à universidade, perdem a referência e passam a andar com pessoas que têm outra visão. Acabam, assim, encontrando terreno fértil para fazer aquilo a que já estavam propensos”, avalia. Por outro lado, o pregador ressalta que vários jovens possuem uma fé sólida, com base na Bíblia. “Esses não abandonam a igreja. É impossível alguém amar a Cristo, alimentar-se de Sua Palavra e abandonar a fé, seja qual for a circunstância”, defende.
Primeiros semestres – O também professor universitário e advogado Sérgio Matheus Pereira de Souza, 32 anos, acredita que a maior parte das instituições acadêmicas da atualidade é intencionalmente preparada para impor uma doutrinação anticristã aos estudantes. Membro da Oitava Igreja Presbiteriana de Belo Horizonte (MG), ele afirma que todos os valores e princípios que o jovem cristão leva consigo são imediatamente contestados e criticados dentro do ambiente acadêmico. “As instituições de ensino, em sua maioria, são formadas por profissionais de visão ideológica progressista. Muitos deles são ateus, mas, também, há agnósticos e adeptos de outras correntes filosóficas que rejeitam e combatem o cristianismo”, salienta. Souza enfatiza que diversos jovens de família ou tradição cristã se afastam da igreja logo nos primeiros semestres da faculdade.
Nossa redação, entretanto, chama a atenção do leitor para outro dado bastante interessante revelado pelo estudo norte-americano citado no início desta reportagem: apesar de abandonarem a fé durante o curso superior, há uma tendência desses jovens a se voltarem novamente para o Senhor quando já estão formados. A pesquisa mostrou que 65% daqueles que se afastaram da igreja durante a faculdade acabaram se reconciliando com Deus algum tempo depois. E esse retorno à igreja não se dá apenas nos EUA.
É o caso do bacharel em Direito Lohan Silva Rodrigues Ferreira, 23 anos, da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Irajá, zona norte do Rio de Janeiro. Nascido em lar evangélico, o rapaz, que se desviou do Evangelho ao ingressar na universidade, avalia o problema. “Conversei com outros jovens e percebi que alguns se afastaram por causa dos prazeres sedutores que há na faculdade”, pontua. Ele assinala que os estudos demandam bastante tempo de leitura dos alunos, os quais podem deixar de frequentar os cultos para priorizar as atividades acadêmicas. “Foi o que aconteceu comigo: estava em um ritmo frenético e precisava dar conta de muitas disciplinas. Por isso, acabei me afastando.”
Lohan Ferreira relata que sua decisão acabou se revelando péssima. Depois de um tempo, ele se sentiu extremamente angustiado. O fato de ter sido educado dentro de princípios cristãos logo deixou evidente sua necessidade de se voltar novamente para Deus. “O Senhor tem o melhor para nós. Somente a vontade dEle é boa, perfeita e agradável.”
Comunhão com o Pai – Nem todos, obviamente, desviam-se do Caminho quando dão início ao curso superior. Essa é a experiência relatada pelo estudante de Jornalismo Daniel Landim de Melo, 25 anos. Ele não se afastou de Cristo após entrar na universidade. No entanto, concorda que a correria da vida acadêmica pode influenciar na ligação de vários estudantes com o Senhor. “Vi jovens se afastando de Deus e deixando-O em segundo plano. Passaram a focar mais nos estudos, esquecendo-se de que Ele tem de estar em primeiro lugar, sempre.”
Daniel Melo sublinha que as amizades também podem influenciar alguns nessa perda de comunhão com o Pai. Ele acredita que o antídoto para esse mal é orar constantemente e meditar na Palavra de Deus todos os dias. “Assim, não seremos tentados a nos desviar do caminho correto”, enfatiza o rapaz, membro da sede regional da IIGD em Nova Iguaçu (RJ), onde atua no ministério de louvor.
O estudante Gabriel da Silva Ferreira, 25 anos, compartilha da mesma opinião de Daniel e deixa claro que a falta de tempo não pode servir de justificativa para o universitário crente abandonar sua comunhão com Deus. O desafio para Gabriel, aliás, é duplo, pois está cursando ao mesmo tempo: Engenharia Civil, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e Marketing, na Universidade Estácio de Sá (UNESA). “Apesar de viver na correria, sempre me dediquei – e sigo me dedicando – à igreja. Estou envolvido nos cultos, congressos e no louvor. Isso me ajuda bastante. Tenho responsabilidade tanto com as coisas de Deus quanto com meus estudos”, informa o jovem, membro da Assembleia de Deus em Pilares, zona norte do Rio de Janeiro (RJ).
Anunciar o Evangelho – Além de integrados em suas igrejas, muitos jovens cristãos atuam em ações evangelísticas nos campi. Eline Sandes, 21 anos, cursa Jornalismo na Universidade de Brasília (UnB). Membro da Igreja Presbiteriana Alvorada, na Asa Norte, em Brasília (DF), ela faz parte do Núcleo de Vida Cristã (NVC), grupo interdenominacional cristão e sem fins lucrativos que se reúne há mais de 25 anos na UnB.
Além de fomentar a comunhão entre aqueles alunos que já creem na Palavra, o objetivo do NVC é levar Cristo àqueles que ainda não O conhecem. Durante a semana, há reuniões – em horários fixos – que são realizadas em formato de culto de adoração, além de grupos de oração, estudos bíblicos, pequenos encontros dos jovens e saídas evangelísticas semanais no campus. “Temos também um clube do livro, de literatura cristã”, descreve a estudante, a qual compara o NVC à Igreja primitiva. “Somos muito unidos e cooperamos uns com os outros, sempre que possível, nos estudos, em oração ou, simplesmente, sendo um ombro amigo. E o fato de ser um grupo interdenominacional nos ajuda a lidar com diferenças de visão de mundo e teológicas. É uma bênção!”
O estudante de Letras Arthur Guanaes, 22 anos, é líder de evangelismo do NVC e membro da Igreja Presbiteriana Redenção, no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA) Sul, na capital federal. Guanaes crê que o trabalho evangelístico desenvolvido dentro da UnB é essencial, especialmente em função das dificuldades impostas aos jovens durante um período longo – no mínimo, quatro anos. “A UnB pode parecer um exílio, e, por isso, nosso intuito é criar um refúgio. Muitos chamam grupos universitários como o nosso de oásis no deserto. Isso, com certeza, faz as pessoas encontrarem, em meio a tantos compromissos, um local de refrigério e paz.”
Arthur Guanaes destaca que a estratégia do NVC funciona tanto para não cristãos, que descobrem o Evangelho, quanto para os que já conhecem Cristo, a fim de fortalecer a fé deles. Ele afirma que a mera formação cultural cristã não é suficiente para manter os estudantes apegados aos ensinamentos bíblicos quando precisam enfrentar debates e influências do ambiente universitário. “Apesar de o Brasil ser considerado um país católico e, agora, cada vez mais evangélico, a evasão eclesiástica [entre os jovens] é bem visível.”
Secretário nacional de Engajamento Missionário da Aliança Bíblica Universitária do Brasil (ABUB), o missionário Josué Bratfich Penteado aponta que a organização não tem apenas o objetivo de anunciar o Evangelho para os não cristãos. Para ele, a ABUB busca levar de volta ao aprisco os que se afastaram da fé. De acordo com Josué Penteado, quando um jovem perde a comunhão com Cristo no ambiente acadêmico, “não significa que abriu mão definitivamente da sua crença em Deus e na Bíblia”.
Josué afirma que o melhor modo de alcançar os dois grupos é por intermédio dos estudantes evangélicos, porque “são os melhores missionários e os mais aptos a cumprir esse papel”. Na visão dele, os que se engajam nessa tarefa se tornam cristãos ainda mais firmes em suas convicções. “No processo de preparação dos próprios universitários, acabamos fazendo com que amadureçam e se aprofundem na fé.”
O trabalho do missionário é justamente oferecer aos jovens as ferramentas necessárias para enfrentar os desafios que possam surgir por meio de cursos, oficinas e treinamentos. “Além disso, damos orientações sobre como estudar e falar da Bíblia para outras pessoas e responder aos desafios, a partir dos valores de Cristo”, complementa. O missionário lembra que esse é o papel de todo servo de Deus e que deve ser desempenhado da melhor maneira, mesmo em meio a um ambiente tão desafiador quanto o universitário. “Os números [como os da pesquisa citada no início da reportagem] nos assustam, mas o amor pelo Evangelho nos encoraja a prosseguir na expansão do Reino de Deus.”
2 Comments
Acho muito importante o papel da família em fortalecer essa base cristã dentro do lar, porque a igreja ( denominação) sozinha nao cosseguiria. Falo isso com propriedade porque sou mãe com formação acadêmica secular e sempre desempenhe meu papel de mãe cristã, ensinando o caminho que eles deveriam andar para nunca se desviar, mostrando que esse caminho não teriam só flores mas também espinhos. Graças a Deus que acertei. Somos membros da AD TC Ceará. Hj meus dois filhos são formados constituíram famílias e são engajados na obra tb. Amém!
Que lindo testemunho! Aleluias!!!