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01/09/2020Na prateleira – 254
01/09/2020NOVAS CORRENTES TEOLÓGICAS (PARTE 1): A TEOLOGIA DO MITO
A teologia do mito tem como um de seus principais criadores o teólogo alemão Rudolf Karl Bultmann (1884-1976). Ele, em 1941, durante a palestra O Novo Testamento da Mitologia, disse que essa parte das Escrituras está cheia de mitos, à luz dos quais se deveriam examinar a pessoa de Cristo e o comportamento da igreja apostólica.
Para Bultmann, todos os escritores do Novo Testamento pensavam e escreviam tendo em vista uma visão global do mundo antigo, no qual havia três divisões: a superior ou invisível (habitada pelos anjos), que é o mundo sobrenatural de Deus; o mundo inferior, escuro, habitado pelos demônios; e o nosso mundo, que fica entre os outros dois.
Bultmann declarou que não se pode utilizar a luz elétrica e os aparelhos de rádio, apelar para medicamentos e clínicas modernas quando se está enfermo, e, ao mesmo tempo, crer nos milagres do Novo Testamento.
Em discurso feito durante a 3ª Assembleia Geral do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), em Nova Déli, na Índia, em 1961, o teólogo afirmou: De acordo com esse processo de determinação, pode-se crer em Jesus Cristo e aceitá-lo como Deus e Salvador sem a necessidade de acreditar no nascimento virginal, na encarnação, no túmulo vazio, na ressurreição e na segunda vinda. Todos esses elementos seriam derivados da mitologia judaica e do gnosticismo helenístico.
Segundo Bultmann, a desmistificação dos evangelhos não significa a eliminação do mito, como procurou fazer a teologia liberal, mas a sua interpretação por meio de uma hermenêutica particular, sendo eles necessários por oferecerem ao homem condições de perceber o enigmatismo do mundo. Assim, por sua reinterpretação, o mito seria utilizado como instrumento auxiliar na compreensão da existência humana.
Influências – Na teologia do mito, percebemos que Bultmann sofreu a influência de diversos filósofos e teólogos, inclusive do ateu francês Charles François Dupuis (1742-1809), que, a partir de 1795, começou a interpretar a Bíblia do ponto de vista místico.
Seguem os conceitos herdados por Bultmann de outras escolas: existencialismo, do filósofo alemão Martin Heidegger (1889-1976); gnosticismo, do filólogo clássico alemão Richard August Reitzenstein (1861-1931), e religião helênica, do teólogo alemão Wilhelm Bousset (1865-1920). Rudolf Karl Bultmann também ensinava outros pontos:
– As Escrituras não explicam a si mesmas, conforme ensina a Hermenêutica da Reforma Protestante, mas estão sujeitas aos métodos modernos da ciência autônoma e às pressuposições filosóficas.
– O cristianismo não é uma religião histórica positiva.
– O evangelho de João está repleto de temas gnósticos.
– Os apóstolos não descrevem a história factual, no entanto acrescentam elementos mitológicos à história original de Jesus.
– A fé de Cristo em milagres não implica que Ele tivesse estado convicto de existir poderes e leis sobrenaturais especiais.
– Os milagres do Nazareno são ambíguos, são figuras, símbolos.
– Os relatos dos milagres, a possessão demoníaca, o conceito do nascimento virginal, da encarnação e da ressurreição dos mortos, por exemplo, são mitológicos.
– Não podemos saber quase nada sobre a vida e a personalidade de Jesus, pois as fontes cristãs primitivas não mostram qualquer interesse em ambos, são fragmentárias e frequentemente lendárias.
– O apóstolo Paulo teria se equivocado ao utilizar histórias de “aparições” para reforçar a crença na ressurreição, adotando como fato histórico o que, na verdade, de acordo com Bultmann, deveria ter sido apresentado como apenas uma metáfora da experiência dos discípulos.
Exame crítico da chamada teologia do mito – Algumas observações críticas à teologia bultmaniana:
– Na sua reinterpretação do Evangelho, Bultmann elimina o sentido original dos termos e torna ininteligível a mensagem.
– O problema do homem é o seu pecado, segundo o Evangelho, e a solução é o sacrifício de Cristo. Para Rudolf Karl, tal problema é a sua finitude.
– O uso da filosofia contemporânea para formular a fé cristã pode distorcer o ensino cristão, introduzir ideias estranhas ao cristianismo por meio da reinterpretação da terminologia tradicional, e acomodar a fé cristã à filosofia tradicional.
– Ao ensinar que a teologia existencialista é antropocêntrica, Bultmann concorda com o filósofo e antropólogo alemão Ludwig Andreas von Feuerbach (1804-1872), autor de A essência do cristianismo, para quem a Teologia se tornara Antropologia.
– Depois do programa de “desmitificação” dos evangelhos, o Jesus de Bultmann que sobra é tão débil que jamais chamaria a atenção de alguém, e muito menos motivaria a sua lealdade. Um Jesus assim tão insignificante tem sido o tema de musicais, filmes e peças teatrais profanas e irreverentes, como Jesus Cristo superstar (1970), na qual Judas Iscariotes é o verdadeiro herói, e Cristo não passa de uma figura covarde, que duvida de sua missão a todo momento.
– Bultmann ignora o papel do Antigo Testamento na formação do Novo Testamento, ao considerar este repleto de mitos e influenciado pelo gnosticismo ou pelo helenismo.
– A Sola fide (somente pela fé, em latim) de Bultmann nada tem de semelhante à do reformador Martinho Lutero (1483-1546), que se baseava no testemunho bíblico.
Abraão de Almeida
Pastor da Igreja Evangélica Brasileira em Coconut Creek, Flórida, EUA, e autor de mais de 30 livros em português e espanhol. E-mail: abraaodealmeida7@gmail.com