Base sólida

Pesquisa mostra estreita relação entre ambiente familiar saudável e a permanência dos filhos nos caminhos do Senhor

Por Evandro Teixeira

No Brasil, o grupo dos que dizem não seguir nenhuma religião cresce a cada ano. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1960, aqueles que não abraçam uma crença formal representavam 0,5% da população; em 1980, correspondiam a 1,6% do povo brasileiro. Porém, esse número avançou rapidamente nas últimas décadas: em 2010, os sem religião já eram 8%. Os dados do Censo 2022 ainda não foram divulgados, mas uma pesquisa realizada no ano passado pelo Instituto Datafolha mostrou que esse percentual pode ter aumentado significativamente nos últimos dez anos, chegando a quase 14%.

As razões para esse crescimento são diversas, mas um levantamento feito nos Estados Unidos indicou uma importante causa desse processo: o colapso dos casamentos e a consequente falta da figura paterna, visto que, na maioria dos casos de separação, as crianças são criadas pela mãe. A pesquisa Nationwide study on faith and relationships (Estudo nacional sobre fé e relacionamentos, em tradução livre), elaborada pela organização sem fins lucrativos Communio, reuniu dados de 19 mil participantes em 13 estados norte-americanos e analisou igrejas protestantes e católicas.

O estudo revelou que 80% dos respondentes que frequentam alguma igreja nos Estados Unidos cresceram em lares com pais casados. O que isso significa é que as pessoas que vão à igreja aos domingos têm mais probabilidade de terem crescido com um pai em casa do que alguém que não vai à igreja aos domingos, informou J. P. De Gance, fundador e presidente da Communio, ao portal norte-americano The Christian Post. Segundo ele, tais resultados não são definitivos, mas confirmam descobertas de outras pesquisas, como a que resultou no livro Faith of the fatherless: the psychology of atheism (Fé dos órfãos: a psicologia do ateísmo, em tradução livre),do pesquisador norte-americano Paul Vitz. Na obra, o autor analisa biografias dos 30 ateus mais conhecidos do mundo e mostra um ponto em comum entre eles: ausência paterna ou relacionamentos rompidos com o pai.

Especialistas afirmam que a família é essencial para a construção de uma sociedade saudável. Assim, se os lares cristãos forem sólidos, haverá uma influência social positiva. Na opinião de estudiosos, como J. P. De Gance e Paul Vitz, os Estados Unidos enfrentam o oposto disso: um recuo da fé cristã em seu território. De Gance acredita que os ambientes familiares conflituosos estão por trás desse fenômeno, mas que isso pode ser enfrentado e revertido com o aumento da qualidade dos casamentos e a atenção redobrada na educação dos filhos.

Para o professor e teólogo Welfany Nolasco Rodrigues, o Brasil, nação que também experimenta um aumento do número de pessoas que não professam nenhuma religião, paradoxalmente vive um movimento contrário dos EUA: o cristianismo evangélico está em crescimento. No entanto, Rodrigues lembra que as famílias cristãs lutam para derrotar as influências sociais negativas. “Essa deve ser a bandeira da igreja, que tem como fundamento a verdade do Evangelho”, frisa o educador. Ele lamenta o fato de os efeitos dos comportamentos mundanos terem chegado à casa do Senhor, pois muitos membros têm aumentado as estatísticas de dependências, dos problemas familiares e dos divórcios. “Se as lideranças se levantarem como uma base para sustentar as famílias, toda a sociedade será transformada”, acredita.

“Exemplo dos pais” – O Pr. Marcelo Rodrigues, líder da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Caldas Novas (GO), concorda que, mesmo estando na igreja, as pessoas têm se afastado dos ensinamentos bíblicos, gerando “a falência do lar”. O ministro costuma exortar os jovens, antes de se casarem, a prestarem atenção à vida espiritual e financeira do companheiro, pois esses aspectos impactarão o núcleo familiar a ser constituído. “Deus instituiu o casamento e a família. Se seguirmos as diretrizes dEle, não falharemos.”

O líder ressalta que o casal precisa orientar os filhos ao estabelecer as bases familiares sobre a Rocha (Mt 7.24-27). “As crianças precisam aprender a partir do exemplo dos pais.” Do contrário, adverte o pastor, serão como os filhos do sacerdote Eli: religiosos, mas com comportamentos abomináveis aos olhos de Deus (1 Sm 2.12).

O Pr. Edson Tadeu Ferreira da Silva Júnior, líder regional da IIGD em Rio das Ostras (RJ), afirma que a família é o principal projeto de Deus, porque nela são lançadas as primeiras sementes do Evangelho. “O Senhor deseja que ponhamos em prática os ensinamentos bíblicos”, salienta. [Leia, no final desta reportagem, o quadro Leitura essencial]

Na opinião do Pr. Leonardo Luís Távora da Silva, da Primeira Igreja Batista em Irajá, zona norte do Rio de Janeiro (RJ), existe uma grande preocupação dos responsáveis com a formação profissional dos filhos, o que é correto. Contudo, muitos pais cristãos negligenciam a responsabilidade de formar bons discípulos de Jesus. “Alguns estão substituindo a presença, a atenção e o diálogo pelos dispositivos eletrônicos. Isso é um perigo”, adverte.

Seguindo a mesma lógica, o Pr. Reginaldo Gomes da Costa, 45 anos, líder da Igreja da Graça em Palmital, no município de Santa Luzia (MG), observa que as famílias enfrentam diversos desafios, principalmente com a chegada das novas tecnologias. Desse modo, alguns pais não têm dado bons exemplos para os filhos: “Infelizmente, levam uma vida sem princípios, desrespeitando a Palavra”, alerta. 

Servir a Deus – A Pra. Joana Angélica dos Santos de Abreu, da Igreja do Evangelho Quadrangular no Magarça, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ), entende que a família foi criada para espelhar o amor de Deus. Casada com o microempresário Joel Correa de Abreu, 44 anos, e mãe de um menino de 15 anos e uma menina de 10, a pregadora se empenha em alicerçar o seu lar na Palavra. “Com meus filhos, nas pequenas e grandes coisas, aplicamos uma lição sobre a importância de sermos conduzidos pelo Espírito Santo”, testemunha.

O pesquisador Jungley de Oliveira Torres Neto, especialista em Filosofia da Religião, lembra que uma família saudável oferece um ambiente propício para a transmissão da fé de geração em geração. Ele reconhece que, na Bíblia, existem maus exemplos de servos, como o sacerdote Eli, mas que também estão registrados bons modelos, como Noé, que, por sua fidelidade ao Criador, conseguiu salvar sua família (Gn 7), e Abraão, que ensinou às gerações futuras como servir a Deus: Porque eu o tenho conhecido, que ele há de ordenar a seus filhos e a sua casa depois dele, para que guardem o caminho do Senhor, para agirem com justiça e juízo; para que o Senhor faça vir sobre Abraão o que acerca dele tem falado (Gn 18.19).

Jungley Neto destaca o papel exercido por outro núcleo fundamental: a igreja. Para ele, o ambiente eclesiástico é relevante para proporcionar apoio, comunhão e crescimento espiritual. “Há um paralelo entre a família genética e a espiritual, pois ambas fornecem o senso de pertencimento e identidade. Enfatizar essa relação é essencial para o fortalecimento do cristianismo.” Com essas duas esferas firmadas na Palavra, toda a sociedade se beneficiará disso, e a fé cristã tende a ser perpetuada.

Reforçando a pesquisa citada nesta reportagem, pode-se dizer que quem cresce em famílias cristãs com uma referência paterna saudável é mais propenso a permanecer na igreja. O contrário pode resultar em um recuo na vivência da cristandade no país, como acontece nos Estados Unidos. “É importante promover uma educação cristã de qualidade, fomentar a comunicação entre as gerações e criar ambientes de diálogo remetendo a exemplos vivos do cristianismo”, orienta o pesquisador.

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