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Pastores e especialistas apontam problemas relacionados ao consumo de álcool entre adolescentes
Por Ana Cleide Pacheco
Apesar de o álcool ser uma droga altamente viciante e com grande potencial destrutivo, seu consumo é amplamente incentivado no Brasil. Beber é um comportamento associado a momentos de prazer e atrai consumidores cada vez mais jovens. Embora a legislação atual proíba a compra de bebidas por menores de 18 anos, a ingestão de produtos etílicos é bastante difundida nessa faixa etária.
De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde dos Escolares (Pense), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pelo Ministério da Educação (MEC), 63,2% dos adolescentes brasileiros já consumiram álcool ao menos uma vez. O trabalho, divulgado em 2022, baseou-se em dados coletados em edições anteriores da sondagem e mostrou um aumento de 4,2% em relação a 2012. Naquela ocasião, 59% dos adolescentes brasileiros disseram ter experimentado algum tipo de bebida alcoólica. Para o recente levantamento, foram ouvidos 159 mil alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, com idades de 13 a 17 anos, das redes pública e privada em todas as capitais brasileiras.
Outra informação apontada pela Pense, que pode ser considerada preocupante, diz respeito ao consumo de álcool pelo sexo feminino. Segundo a investigação, 67,4% das meninas já provavam bebida alcoólica; entre os meninos, o percentual é menor: 58,8%. O psicanalista João Luiz Vieira, 52 anos, lembra que a divulgação do estudo coincide com um importante momento histórico denominado “empoderamento feminino”. “Eu o considero importante, do ponto de vista da valorização das mulheres, do incentivo à autoestima e do respeito a elas. Em contrapartida, encontramos meninas confundindo isso com permissividade”, opina Vieira, alertando para o fato de que essa deturpação pode ser uma das principais causas do aumento do uso de álcool entre tantas adolescentes. Tal ação faz com que, equivocadamente, tenham atitudes destrutivas para si mesmas. “O álcool é só um começo. Depois dele, vêm as outras drogas, o abandono de valores, a promiscuidade e a dependência química.”
O psicanalista esclarece que, nas mulheres, o álcool age mais rápido. Assim, chegam mais facilmente ao estado de embriaguez, o que as deixa mais expostas a situações de abusos, inclusive os sexuais. Ele aponta ainda que este tipo de violência tende a gerar traumas profundos, e, na maioria das vezes, a jovem permane bebendo na tentativa de escapar da dor emocional. “Trata-se de um poço sem fundo, e é importante conscientizar as moças disso”, informa João Luiz, membro da Assembleia de Deus Hebrom, no bairro de São Pedro, em Teresópolis (RJ).
A neurobióloga Célia Regina Gomes de Moraes, 65 anos, presidente do Desafio Jovem de Brasília, instituição que atende a dependentes químicos, diz ter observado esse aumento do consumo de álcool entre o sexo feminino. “Há várias explicações para isso, a começar pelo marketing da cerveja, que viu seu mercado estagnado entre o público masculino e passou a assediar as mulheres. Inegavelmente, teve êxito”, lamenta a especialista, assinalando que, além disso, elas demoram muito a procurar auxílio. “A busca por tratamento ocorre somente após longos anos de consumo, devido a problemas de saúde ou por entenderem que estão dependentes dessa droga”, informa Célia Regina, membro da Igreja Batista Central na Asa Sul, em Brasília (DF).
Verdadeiramente livres – Segundo os especialistas, mesmo quando o jovem não apresenta mais dependência, há sempre o risco de recaída. Por isso, o Pr. João Pedro Magalhães Silva, 29 anos, líder regional de jovens na Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) na Freguesia, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ), acredita que a nova geração precisa de uma atenção especial. Na opinião do pregador, a Igreja deve ensinar os jovens a serem cheios do Espírito Santo e a resistirem às ofertas mundanas, como fez o profeta Daniel (Dn 1.1-18). “Dessa forma, mesmo estando em ambientes em que as pessoas não compartilham de suas crenças, eles não aceitarão os manjares deste mundo, rejeitando qualquer proposta que os faça sair da presença de Deus.”
O Pr. Marcos Aurélio Dias, 50 anos, líder do ministério de família da Primeira Igreja Batista de Niterói (RJ), ressalta que toda tentação é sempre apresentada de forma sedutora e sutil. “Aquele que veio para roubar, matar e destruir não vem travestido de vermelho e chifres pontudos. Mas, muitas vezes, utiliza de estratégias e pessoas para colocar seus planos de destruição em ação, confundindo os jovens. Um exemplo disso é quando são indagados com a seguinte frase: ‘O que tem de mal nisso?’. O papel da Igreja é dar luz a essa situação.”
Segundo Dias, as comunidades cristãs são fundamentais no processo de conscientização da juventude acerca dos malefícios da bebida. “O papel da Igreja é mostrar para os jovens que, na dúvida, não devem se deixar levar pelas tentações, principalmente, se há casos de dependência alcoólica na família. Deus não quer somente nos salvar, mas também nos libertar de toda a escravidão do pecado. Em João 8.36, está escrito: Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente, sereis livres. Portanto, sejamos livres!”
Foi a partir de um encontro com Cristo que o recepcionista Paul Di’anno Macedo Pedrada, 25 anos, foi liberto da compulsão alcóolica. O primeiro contato dele com a bebida aconteceu aos 16 anos. Aos 21, já estava dependente. Ele chegou a frequentar a Igreja por um período, mas não conseguia passar um fim de semana sem beber e usar maconha. Nesse processo, Paul acredita ter recebido muitos livramentos. “Deus me guardou e me conduziu debaixo de Sua graça e proteção, mesmo antes de conhecê-Lo”, testemunha.
O rapaz somente se livrou da dependência, quando teve uma experiência inusitada com o Senhor. Em uma sexta-feira, ele foi a uma praça da cidade para um show de rock. Contudo, por algum motivo, o evento não aconteceu. Paul já havia bebido e, ao chegar ao local, em vez da apresentação, encontrou alguns jovens que conhecia da Igreja. “Já estava bêbado e com o rosto desfigurado. Quando os vi caminhando na minha direção, queria um buraco para me esconder. Tinha certeza de que me julgariam, mas foi o oposto: eles me trataram com amor e me convidaram para o culto jovem que ocorreria no dia seguinte”, relata.
Sentindo algo diferente em seu espírito, ao chegar à sua casa, fez uma oração: “Meu Deus, a partir de hoje, deixo de beber e buscarei somente a Ti”. Daquele dia em diante, o rapaz nunca mais colocou sequer um gole de bebida na boca. Paul está liberto das drogas e, atualmente, serve a Deus como líder de jovens, obreiro e baterista do ministério de louvor da sede estadual da IIGD no Amapá, Macapá (AP).
Momentos de lazer – O faturista César Henrique Alves da Rosa, 32 anos, também teve uma experiência sobrenatural de libertação. Membro da IIGD na Cidade de Deus, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ), onde atua no ministério de louvor e na liderança dos Jovens Que Vencem (JQV), ele conta que passou a beber depois de desviar dos caminhos do Senhor. “Conheci Cristo no ano 2000, e servi a Ele até 2016. Tive então uma decepção amorosa e acabei enfraquecendo na fé. Como não encontrei apoio, acabei me afastando da Palavra e comecei a consumir bebidas alcoólicas. Foram cinco anos longe de Jesus.”
De acordo com César, ele não chegou a ser dependente alcóolico, mas usava a bebida como uma falsa válvula de escape, uma tentativa momentânea de suprir o vazio que sentia. Por um momento, a bebida lhe dava certo alívio, porém, logo depois, todos os problemas e a tristeza voltavam a assolar a mente dele. Nessas horas, segundo o faturista, sentia-se pior do que antes. Sofria por não estar na Igreja, ao mesmo tempo, não tinha forças para retornar. “Diante de tudo isso, no final de 2021, percebi que estava indo longe demais. Tinha relacionamentos que não faziam sentido e só me levavam à libertinagem”, conta.
Foi quando decidiu participar de uma vigília e conversar com o pastor. “Ele me ajudou, estendeu a mão para mim. Percebi que o melhor caminho era Jesus e voltei para Ele. Hoje, minha vida está estabilizada, tenho controle emocional, consigo lidar com as lutas, minhas noites de sono são tranquilas e faço a obra de Deus com amor”, celebra.
De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), os meios de comunicação estão entre os principais responsáveis pelo incentivo ao consumo de álcool por associá-lo a momentos de diversão e interação social. “O uso de bebidas alcoólicas passou a ser sinônimo de lazer. Por ser um conceito equivocado, gerará graves consequências aos nossos jovens que estão com o cérebro em desenvolvimento”, informa o psiquiatra Antônio Geraldo da Silva, presidente da ABP.
O especialista afirma que as crianças e os jovens devem ser guardados dessa pressão que sofrem para consumir bebidas alcoólicas. “Iniciativas globais que promovam a prevenção e a redução do uso de álcool na adolescência são fundamentais.” Na opinião de Geraldo Silva, a produção e a distribuição de bebidas alcoólicas devem ser regulamentadas a fim de proteger os jovens e outros grupos vulneráveis. “Atividades educativas, com foco na prevenção ao uso de álcool nos ambientes familiar, escolar e na comunidade, também devem ser efetivas, para que os rapazes e as moças façam escolhas saudáveis e reflitam sobre as implicações de suas decisões ao longo da vida”, conclui.