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A depressão é uma doença que precisa de tratamento do ponto de vista físico, mental e espiritual
Por Patrícia Scott
Informações da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2019, levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam para um crescimento alarmante dos casos de depressão no Brasil. Nos últimos seis anos, o número de pessoas que declaram ter sido diagnosticadas com a doença subiu 34,2%, atingindo 16,3 milhões de brasileiros.
Em 2020, o número de quem é afligido por ela pode ter aumentado ainda mais devido à pandemia de covid-19. É o que indica, por exemplo, uma análise do Instituto de Psicologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), a qual indica uma elevação de 50% no número de casos nos meses de março e abril do ano passado. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores utilizaram dados coletados com 1.460 indivíduos de 23 estados, que responderam a um questionário on-line com mais de 200 perguntas. Na primeira coleta de informações, feita do dia 20 a 25 de março, foi registrado um percentual de 4,2% de participantes com depressão; na segunda (de 15 a 20 de abril), o número quase dobrou, saltando para 8%.
Especialistas explicam que depressão é diferente de tristeza: é uma doença, com características específicas e requer tratamento. O Manual de diagnóstico e estatística dos transtornos mentais (DSM-5) elenca uma série de sintomas que sinalizam um quadro depressivo, tais como perda de interesse nas atividades do dia a dia (mesmo as mais prazerosas), sentimento de culpa, baixa autoestima, alterações de sono (falta ou excesso), problemas com o apetite (perda ou aumento exagerado) e falta de concentração. Além disso, muitas vezes, a disfunção pode estar associada à ansiedade e, nos casos mais graves, culmina até mesmo em suicídio.
A psicóloga Daniela Generoso lembra que a tristeza é um sentimento surgido a partir de uma situação específica e tem duração curta, enquanto a depressão faz o sujeito ter pensamentos e sentimentos ruins. “Pode ser de ordem biológica em decorrência da falta de serotonina e dopamina, neurotransmissores responsáveis pela felicidade e alegria”, explica.
Ela enfatiza que o sujeito depressivo fica incapacitado para gerir de maneira saudável as suas emoções. “Se anteriormente a pessoa tinha motivação para trabalhar, ir às festas ou produzir algo que lhe dava prazer, agora ela só consegue pensar o quanto a vida perdeu a cor e o brilho”, frisa Generoso, destacando que existem outros sinais da depressão para os quais é necessário atentar. “Crises existenciais, confusão mental, dificuldade de tomar decisões e de lidar com perdas e frustrações, pensamentos de morte, sensação de vazio.”
Estresse e pressão – A psicóloga Luciene Rodrigues Gonçalves explica que não existe um momento ideal para buscar ajuda específica em se tratando de um transtorno de humor como a depressão. Entretanto, assinala que, se a pessoa percebe algo que esteja prejudicando o desenvolvimento das suas atividades diárias e os seus relacionamentos, deve procurar apoio imediatamente. “A terapia deve ser iniciada logo que surgem os primeiros sintomas, para uma possível crise ser evitada.”
A especialista pontua que alguns gatilhos podem desencadear a enfermidade, como momentos de estresse e pressão. Por exemplo, o isolamento social, o consumo de drogas lícitas e ilícitas ou mesmo problemas crônicos de saúde podem ser uma porta de entrada para depressão. “No entanto, varia de uma pessoa para outra. Muitas vezes, uma situação que nos parece pouco traumática, como o término de um relacionamento, gera a doença.”
O fim de um casamento de 18 anos, em 2016, foi o que precipitou a dona de casa Cátia Ferreira Ribeiro, 42, na depressão, potencializada pelo consumo de álcool. “Não tinha vontade de fazer absolutamente nada. Não via graça nas coisas. Todos os dias eram iguais”, relembra-se Cátia, assinalando que não saía de sua residência e vivia em permanente estado de desânimo: apenas a televisão era sua companhia. “Não aceitei tratamento com psicólogo nem acompanhamento médico”, relata ela, que hoje congrega na Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) na Taquara, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ).
Cátia somente experimentaria uma mudança de vida em 2018, ao assistir ao programa Show da Fé, com o Missionário R. R. Soares. “Comecei a acompanhar as mensagens dele. Até que decidi buscar ajuda na Igreja da Graça.” A partir do entendimento da Palavra e das campanhas de oração, ela se libertou do transtorno mental. “Aos poucos, minha mentalidade foi mudando, e o meu comportamento também, pela ação do Espírito Santo”, testemunha.
Problemas no relacionamento conjugal conduziram a dona de casa Fátima Maria de Carvalho, 64 anos, a entrar em depressão. O marido dela era alcoólatra, e os desentendimentos com ele eram constantes, assim como as crises financeiras. “Ele também era muito ciumento. Foi uma sequência de situações que me levou para o estado depressivo”, diz Fátima, que, todos os dias, tomava vários medicamentos prescritos pelo psiquiatra. “Fazia terapia toda semana para reorganizar meus pensamentos e sentimentos.”
Ela frisa os momentos em que passava grande parte do dia deitada, sem disposição para nada. “À noite, não conseguia dormir mesmo com os medicamentos. Ficava em frente à TV e consumia muitos doces”, recorda-se a serva de Cristo, a qual congrega na IIGD de Umbará, em Curitiba (PR). Ela teve sua saúde mental restabelecida em 2012, enquanto via o Show da Fé. Fátima orou com o Missionário R. R. Soares e repreendeu todo o mal. “Coloquei a minha fé em ação. A partir daquele dia, comecei a melhorar”, testemunha, destacando que está curada.
Nutrição e exercícios – A depressão tem, de acordo com os estudiosos, causas multifatoriais – e, registre-se, eventos ambientais e fatores orgânicos (inclusive alimentação) estão envolvidos. Desde 2009, sabe-se que é possível ligar a composição do prato de comida ao surgimento da depressão. Segundo a nutricionista Lilian Brum Di Mare, estudos mostram que o cérebro é o órgão que possui mais conexão com o intestino e vice-versa. “A serotonina, substância altamente ligada ao humor e à felicidade, tem sua produção em 95% no intestino e 5% no cérebro. Não tem como tratar ou prevenir a depressão sem pensar na alimentação”, explica a especialista, advertindo que o profissional de Nutrição deve observar o quadro clínico de cada um na hora de elaborar a dieta alimentar (personalizada). Porém, em geral, Lilian recomenda o consumo de carnes, leite, ovos, banana, figo, tâmara, pão integral, brócolis, couve-flor, couve, peixe, aveia, espinafre e abóbora.
Por outro lado, novas sondagens reforçam o poder da atividade física para o bem-estar psicológico. Nos Estados Unidos, um levantamento do Instituto Black Dog – o qual englobava 34 mil adultos ao longo de 11 anos – concluiu que os praticantes regulares de atividade física são menos propensos a ter manifestações da depressão com o passar do tempo. A análise indicou que 12% dos casos da doença poderiam ter sido evitados se todos os participantes fizessem pelo menos uma hora de exercício por semana. Ignorar esse conselho representava um risco 44% maior de a pessoa ficar deprimida. No Brasil, o estudo do Prof. Felipe Schuch com pacientes deprimidos de maneira severa e internados no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (RS) constatou que indivíduos submetidos a um tratamento que combinava medicações e atividade física apresentavam melhores resultados do que aqueles que só utilizavam comprimidos. “Sabe-se que o esporte promove a liberação de endorfina, o hormônio do prazer, e de outros neurotransmissores por trás da sensação de bem-estar”, pondera o professor de Educação Física Willow Gomes, acrescentando que “experimentos recentes mostram que atividades físicas também estimulam o crescimento de células nervosas no hipocampo, região do cérebro que rege a memória e o humor”.
Willow explica que o principal objetivo na montagem de um plano de exercícios de alguém que encara a depressão não é definição muscular ou perda de peso. “O crucial é fazer o indivíduo ter novas metas e sentir-se bem.” Por isso, segundo ele, o educador físico precisa conhecer as condições e as limitações do aluno e estimulá-lo na medida certa. A socialização proporcionada pela academia, na visão do professor, é igualmente outro ponto positivo. “É um local para conhecer pessoas, conversar, sair da rotina, o que auxilia tanto na prevenção quanto no combate à depressão.”
“Fonte de vida” – A relação entre saúde mental e a fé vem sendo alvo de dezenas de análises, muitas delas publicadas em revistas científicas de renome internacional, permitindo concluir que há uma associação positiva entre religiosidade e o equilíbrio da mente. Um exemplo é uma pesquisa feita pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) em conjunto com a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Nela, foi avaliado como a espiritualidade e a religiosidade influenciavam na qualidade de vida e na saúde mental. Os resultados, divulgados em 2018, foram que quanto maiores eram os níveis de espiritualidade, menores eram os riscos de desenvolvimento de depressão e ansiedade.
O Pr. Wilson Lima, da Igreja da Graça no Catumbi, zona norte do Rio de Janeiro (RJ), afirma que a fé no Senhor é o que mantém o indivíduo de pé. Por isso, o aspecto espiritual da depressão não pode ser negligenciado. “É uma doença mental, emocional, mas, também, espiritual. Então, a pessoa precisa ser tratada e acompanhada dentro de todo esse contexto”, opina.
Citando o exemplo do profeta Elias, que entrou em um processo depressivo ao se sentir ameaçado e solitário diante de determinadas circunstâncias, Lima acentua que “ele estabeleceu um diálogo interno inadequado, sentiu-se desmotivado e pediu a morte a Deus [1 Reis 19.1-8]”. Sem ter prazer e motivação para viver, o profeta foi levantado pela Palavra. “Portanto, deve-se recorrer à Bíblia, meditar nos seus ensinamentos dia e noite, porque ela é a fonte de vida.”
Na visão da Pra. Sarah Araújo Xavier, auxiliar na sede distrital da IIGD em Brasília (DF), a Palavra é a chave para expulsar todo mal, porque gera fé no coração da pessoa, o que a torna bem-sucedida. “Na Bíblia, há uma série de versículos que estimulam o bom ânimo, a esperança, a ousadia para o enfrentamento dos dias maus.” Sarah Xavier aponta a igreja como um local que proporciona transformação na mentalidade e no comportamento do indivíduo a partir dos ensinamentos dos valores cristãos. “É na casa do Senhor que a pessoa recebe o entendimento, que gera fé e força para enfrentar suas lutas internas e externas”, argumenta a pastora, reforçando que a depressão é uma doença que pode (e deve) merecer tratamento especializado. “A fé é importante, porém é preciso identificar o que está ocorrendo para a pessoa lutar com as armas corretas.”