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Suécia lança versão das Escrituras voltada para o público infantil com o objetivo de promover a ideologia de gênero
Por Evandro Teixeira
A Bíblia é o livro mais lido e traduzido do mundo. A necessidade de difundi-la, ao longo dos séculos, fez o Texto Sagrado – originalmente escrito em grego, hebraico e aramaico – ser traduzido para diferentes idiomas, inclusive com edições especiais para crianças. Porém, recentemente, o anúncio de uma publicação direcionada para os pequeninos (Barnens Bästa Bibel, em português, algo como a melhor Bíblia infantil) chamou a atenção da comunidade cristã mundial. A novidade vem da Suécia: uma versão bíblica que, segundo os editores, tem uma perspectiva de gênero.
A iniciativa é do teólogo Sören Dalevi, bispo da Igreja Protestante da Suécia em Karlstad, cidade de 98 mil habitantes situada no Sul do país. De acordo com ele, sua tradução conta a história da criação de forma diferente. Nela, o homem não foi criado antes da mulher, por exemplo, uma interpretação do texto que estaria, em sua opinião, mais próxima do original hebraico. Além disso, Deus é mantido sem gênero em quase todas as passagens. Sempre que possível, chamo Deus de Deus, que é [um termo] assexuado, declarou Dalevi, em reportagem de um jornal sueco. Por sua vez, na mesma matéria, o ilustrador da Barnens Bästa Bibel, Marcus-Gunnar Pettersson, declara: Fomos cuidadosos para não dizer que Eva era isso ou aquilo, do ponto de vista sexual. Adão e Eva estavam juntos. Nós os igualamos. Não fazemos de Eva uma pecadora. O pecado original é uma coisa que eles fizeram juntos.
Embora não se trate de uma publicação brasileira, pastores, teólogos e especialistas alertam para o perigo que esse tipo de material representa por contrariar o ensino bíblico ortodoxo acerca da criação. Uma dessas vozes é da psicóloga Rafaella Pinheiro Belarmino de Matos, da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Indaiatuba (SP). Segundo ela, a ideologia de gênero propõe uma ruptura na natureza humana estabelecida pelo Altíssimo por pregar uma construção dissociada do sexo biológico. “Trata-se de um movimento que visa trocar a verdade de Deus pela mentira fabricada pela própria concupiscência humana.”
Para o Pr. Roberto José Inácio, líder da Assembleia de Deus Philadelfia, no Anil, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ), é preciso que as lideranças estejam atentas a todos os tipos de deturpação do Texto Santo. “Como ministro do Evangelho e ensinador, jamais aceitarei esse tipo de versão.” Apesar de destacar que se tratava de uma publicação lançada na Suécia, ele disse acreditar que, com os avanços tecnológicos, a versão poderia chegar ao Brasil já traduzida, colocando à prova a qualidade do ensino das igrejas. No entanto, deixou claro que “as comunidades cristãs bem lideradas não se sentirão ameaçadas”.
Adulteração das Escrituras – Embora a Bíblia em questão seja um produto focado nos pequenos, a psicóloga Adjane Keilla de Oliveira Souza Lucena, enfatiza que os meninos e as meninas somente terão acesso a esse tipo de conteúdo se forem presenteados pelos adultos, pois eles são os detentores do poder de compra. “O adulto estará, na verdade, atendendo aos próprios anseios, incutindo na mente das crianças conceitos que poderão influenciar as futuras gerações”, analisa Lucena, membro da 7ª Igreja Presbiteriana de Maceió (AL).
Ela salienta que as Bíblias infantis são as principias ferramentas didáticas para promover a aproximação da criança com a mensagem do Evangelho e, consequentemente, levá-la a uma comunhão com Deus. Por isso, ela assinala que distorcer tal mensagem, como propõe a publicação sueca, certamente trará implicações significativas para o desenvolvimento do pequenino. A especialista acrescenta que a teologia bíblica visa conduzir e orientar o homem em suas ações. Portanto, em seu ponto de vista, modificar seus ensinamentos é uma forma de induzir os inocentes a aceitar como real o que é uma adulteração das Escrituras. “Trata-se de um discurso retórico arbitrário e utópico, que não reflete a realidade.”
Por mais absurdas que possam ser traduções como essa, o Pr. Gilberto da Silva, mestre em Ciências da Religião, informa que não existem meios legais de impor limites às versões bíblicas. Isso porque os manuscritos, que já caíram em domínio público, podem ser traduzidos sem autorização prévia de um autor ou herdeiro legal. Além disso, as cópias dos originais existentes, que somam mais de sete mil, estão em museus e centros de pesquisa espalhados pelo mundo. “Entre o Antigo e o Novo Testamento, temos um longo período que envolve mais de 40 escritores. Quem seriam seus representantes legais?”, observa Silva, lembrando que, caso essa publicação sueca chegasse ao Brasil, não haveria qualquer forma de impedir sua livre comercialização, pois a proibição seria caracterizada como censura.
A possibilidade de existir, no mercado, literatura cristã para crianças com conteúdo estranho exige uma atenção especial dos pais, reforça o Pr. Leonardo Luís Távora da Silva, líder da Primeira Igreja Batista em Vila Aliança, zona oeste do Rio de Janeiro (RJ). Para o pregador, a melhor forma de livrar os pequenos de ameaças externas é mostrar-lhes que existe uma autoridade maior, o próprio Deus, e que a humanidade não deve viver ao seu bel prazer. “Isso é possível por meio do ensino genuíno da Palavra”, orienta. Ele acrescenta que, como cristãos, precisamos continuar afirmando que o estilo de vida homossexual não é o projeto original de Deus para a sua criação. “No entanto, não podemos nos esquecer da necessidade de levar a salvação em Cristo Jesus àqueles que vivem nessa prática”, pontua. [Leia o quadro A Bíblia e a ideologia de gênero]
Futuro da Igreja – A pedagoga Simone Maia de Carvalho acredita que essa versão bíblica publicada na Suécia seja o reflexo da sociedade de hoje, globalizada e corrompida, e sinaliza que a Igreja de Cristo vive dias difíceis. “As Escrituras estão se cumprindo mundialmente”, resume, citando o texto de 2 Timotéo 3.1-5 (Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos; porque haverá homens amantes de si mesmo […] obstinados, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela). Entretanto, a especialista teme que, no Brasil, alguns cristãos não estejam preparados para enfrentar certas deturpações teológicas em razão da defasagem educacional da população a qual se reflete no campo religioso.
Na opinião do Pr. Douglas dos Santos Paiva, líder regional da IIGD em Santa Luzia (MG), a preocupação principal do cristão deve ser a preservação da mensagem das Escrituras. Ele frisa que a Palavra não pode sofrer adulterações, como adverte o próprio Texto Sagrado: Antes, rejeitamos as coisas que, por vergonha, se ocultam, não andando com astúcia nem falsificando a palavra de Deus (2 Coríntios 4.2a). O ministro sublinha que qualquer alteração na Palavra constitui pecado e pode mover a ira do Todo-Poderoso. “Como servos do Senhor, devemos continuar lutando contra aquilo que fere a essência do cristianismo.”
O líder reafirma ser necessário cuidar bem da educação religiosa das crianças, pois a Bíblia adverte que os filhos deste mundo são mais prudentes na sua geração do que os filhos da luz (Lc 16.8b). Contudo, essa atenção não deve se limitar aos lares. As comunidades cristãs têm de estar atentas: “Precisamos vigiar quanto ao ensino de nossas crianças, pois elas serão o futuro da Igreja”.
A Bíblia e a ideologia de gênero
A ideologia de gênero é, essencialmente, uma construção filosófica com verniz científico que procura fazer uma distinção entre sexo e gênero. Para os seus defensores, o primeiro é determinado biologicamente, e o segundo, pelo meio social. Esse tipo de visão acaba chocando-se com os ensinos da Bíblia Sagrada referentes à criação de Deus.
Segundo as Escrituras, o Altíssimo fez Adão e Eva com diferenças muito claras, conforme relato de Gênesis 1.27: E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; macho e fêmea os criou. A ideologia de gênero contraria, portanto, esse princípio básico ao declarar que alguém que nasce homem pode sentir-se mulher ou não se identificar nem com um sexo nem com o outro, alegando que o gênero é fluido e socialmente construído. Afrontando sistematicamente a doutrina da criação divina, a ideologia de gênero busca criar um ser humano indefinido, com o intuito de apagar dele todos os resquícios da imagem e da semelhança do Criador. Logo, esse arremedo ideológico é um gravíssimo atentado contra a antropologia bíblica, pois ofende o homem e a mulher tais quais o Senhor os criou, analisa o pastor e teólogo assembleiano Claudionor Andrade, em artigo sobre o tema publicado no portal CPAD News.
De acordo com as Sagradas Escrituras, a família foi criada tanto para a formação do lar (Gênesis 2.24: Portanto, deixará o varão o seu pai e a sua mãe e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne) quanto para a perpetuação da espécie (Gênesis 9.7: Mas vós, frutificai e multiplicai-vos; povoai abundantemente a terra e multiplicai-vos nela). No entendimento de Claudionor Andrade, a ideologia de gênero ataca frontalmente essa instituição: Ao apregoar não haver diferenças básicas, espirituais e psicológicas entre o homem e a mulher, […] atenta de modo ímpio e impiedoso contra a família divinamente instituída pelo Criador. (Evandro Teixeira, com informações de CPAD News e Gospel Mais)