Jornal das Boas-Novas – 294
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Por que pregar as Boas-Novas aos encarcerados gera reflexos significativos na sociedade
Por Patrícia Scott
A população prisional no Brasil bateu novo recorde em 2022, chegando a 832,2 mil pessoas – um aumento de 257% desde 2000. A informação consta da edição de 2023 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, documento elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). A organização, não governamental, apartidária e sem fins lucrativos, é integrada por pesquisadores, cientistas sociais, gestores públicos, policiais federais, civis e militares, operadores da Justiça e profissionais de entidades da sociedade civil.
De acordo com a Lei de Execução Penal (Lei n° 7.210/1984), o Estado tem o dever de punir o infrator – quando há condenação – e recolhê-lo em uma das unidades prisionais da federação. Em contrapartida, durante o cumprimento da pena, o Estado precisa desenvolver ações que garantam ao indivíduo condições de se reintegrar ao convívio social, e, desse modo, não voltar a cometer crimes.
Porém, na prática, não é o que acontece no nosso sistema carcerário. Um estudo do Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), concluído em 2020, apontou que a taxa de reincidência criminal no Brasil passa de 42% e revelou que os programas de ressocialização oferecidos são modestos. O anuário citado demonstrou, por exemplo, que só 19% dos detentos participam de programas de laborterapia (terapia por meio do trabalho).
É nesse cenário, complicado e desafiador, que a Igreja de Cristo vem desenvolvendo ações para levar aos presos, em diferentes regiões do Brasil, a Boa Notícia do Alto. “O Estado precisa desse trabalho voluntário, pois, sozinho, não dá conta de ressocializar os que estão desprovidos de liberdade. É do interesse público que essas pessoas sejam restauradas. Sem a intervenção divina, elas sairão piores do que quando entraram na prisão”, avalia a capelã Ana Cristina Souza Barbosa, que prega, há cinco anos, no Centro de Detenção Provisória da Serra (CDPS), no Espírito Santo. [Leia, no final desta reportagem, o quadro Capelania prisional]
Ela explica que as mudanças promovidas pelo Evangelho nos detentos, muitas vezes, são lentas. “Eles assistem aos cultos, participam das orações e observam os testemunhos. E, gradativamente, são alcançados pelo Senhor.” Ana Cristina também destaca que a paz de Deus, que excede todo o entendimento (Fp 4.7), é uma das primeiras vivências que os presos experimentam com o Espírito Santo. “Os detentos começam a perceber que a alegria e a esperança não dependem das circunstâncias, e sim da presença do Altíssimo.”
A pregadora aponta que a capelania é o serviço da Igreja fora das quatro paredes. “Não olhamos para o que a pessoa fez, e sim para as almas que estão necessitadas do Senhor”, relata. Ao ser questionada por nossa reportagem sobre o que poderia ser feito para reduzir a reincidência, a capelã ressaltou que tão importante quanto a evangelização no cárcere é o acompanhamento após o cumprimento da pena. “Essas pessoas precisam de acolhimento, emprego e assistência espiritual, a fim de que tenham a fé alimentada. Quando deixam a prisão, realizamos o encaminhamento para uma igreja, ajudamos na busca de trabalho e auxiliamos a família no processo de readaptação social.”
“Nova vida” – Foi no sistema prisional que Celso Godoy foi alcançado pelo amor de Jesus, há 35 anos. Hoje é pastor e atua como capelão prisional, mas durante sete anos, ele cumpriu pena por tráfico de drogas: “Deus mudou a minha vida, a minha história, para a glória dEle”, alegra-se o pregador, ressaltando que a Palavra é fundamental para o processo de transformação, libertação e ressocialização dos presos.
De acordo com Godoy, as Escrituras atuam como bálsamo, alcançando não apenas a mente, como também o coração daqueles que estão desprovidos de liberdade. “A partir daí, ocorre a consciência do pecado, do mal que causaram à sociedade e das dificuldades que geraram para as famílias deles. O Evangelho possibilita intimidade com o Criador e autoconhecimento, pois a pessoa é confrontada”, explica o capelão, afirmando que muitos vivem desesperançosos porque não acreditam ser viável haver um recomeço, uma nova vida. “O impacto da mensagem das Escrituras proporciona uma luz no fim do túnel, que é Jesus iluminando a mente em um processo de metanoia”, salienta Celso Godoy, referindo-se a uma palavra grega, encontrada no Novo Testamento, que significa mudança de mente. “Um coração alcançado pela graça não permanecerá o mesmo, ele dará bons frutos”, acrescenta.
Por sua vez, a Pra. Verônica Araújo, da sede estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em Florianópolis (SC), lembra que, para os internos, vítimas de muito preconceito, a esperança e o amor propagados pelo Livro Santo faz toda a diferença na vida deles. “Eles percebem a importância do arrependimento e do perdão para que ocorra o processo de reabilitação”, sublinha a ministra, que já atuou como evangelista no sistema prisional.
Os reflexos das iniciativas de capelania e evangelização em presídios estão registrados em diversos estudos já promovidos sobre o tema. Um dos mais recentes foi realizado pela Universidade Baylor, dos Estados Unidos, em parceria com a Prison Fellowship International (PFI, a sigla em inglês para Fraternidade Prisional Internacional). A pesquisa apresenta novas evidências de que a fé tem um efeito positivo na saúde mental dos detentos. O relatório dos pesquisadores mostra que, em geral, as prisões abrigam criminosos que, em liberdade, já eram capazes de cometer atos terríveis; e, uma vez encarcerados, acabam por dar lugar ao desejo de vingança e aos ressentimentos. Além disso, ainda precisam lidar com a falta de esperança, o senso de fracasso e outras emoções negativas.
Entretanto, o levantamento, realizado na Prisão de Monteria, na Colômbia, revelou que os detentos apegados à fé cristã se mostram menos irritados com sua condição, são mais esperançosos em relação ao futuro e têm a capacidade de perdoar seus inimigos. Foi constatado também que os presos que oravam e liam a Bíblia demonstravam mais autocontrole e gratidão em relação aos que não o faziam. Eles apresentavam menos raiva, depressão e ansiedade. Este estudo confirma o que acreditamos há muito tempo. O envolvimento de um prisioneiro em programas religiosos gera um efeito transformador em suas crenças, atitudes e seu comportamento. Agora, temos evidências empíricas de que os prisioneiros estão se tornando menos violentos e exercendo maior autocontrole por meio de programas como o da PFI em todo o mundo, disse David Van Patten, diretor de operações da PFI, em entrevista ao portal de notícias norte-americano Christian Broadcasting Network (CBN) News.
A pesquisa da Fraternidade Prisional Internacional se concentrou nos participantes do curso de oito semanas denominado A Jornada do Prisioneiro, desenvolvido pela PFI para ensinar aos encarcerados sobre o Evangelho. Este estudo contribui para a literatura de Justiça Criminal ao adicionar evidências positivas do efeito virtuoso da religião na saúde mental entre indivíduos encarcerados, informou, ao CBN News, o Dr. Sung Joon Jang, professor, pesquisador de Criminologia e codiretor do Programa de Comportamento Pró-Social do Instituto Universitário de Estudos de Religião da Universidade Baylor. Descobrimos que os comportamentos religiosos públicos e privados estavam positivamente associados às virtudes, acrescentou Jang.
Valores morais – O Pr. Sérgio Junger, capelão prisional no estado do Espírito Santo, nota diariamente as manifestações de fé e as mudanças dos presos. “O indivíduo que comete um crime está com as emoções desequilibradas e o caráter distorcido. Somente Jesus é capaz de transformá-lo”, frisa o pregador, assinalando que, à medida que os detentos participam das reuniões e têm contato com o Texto Sagrado, eles descobrem, pouco a pouco, a verdadeira liberdade, a de Cristo, ainda que permaneçam fisicamente encarcerados. “E, assim, uma nova perspectiva de vida é construída.”
Segundo Junger, quando os presos aceitam Jesus, tornando-se morada do Espírito Santo, nascem de novo e são gerados neles os frutos que o apóstolo Paulo cita em Gálatas 5.22: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio. Devido à grande ociosidade na unidade prisional, observa o ministro, os detentos têm muito tempo para orar, ler o Livro Santo, refletir sobre a vida e projetar o futuro fora da cadeia – livres em Cristo.
CAPELANIA PRISIONAL
A Palavra de Deus se refere claramente à responsabilidade dos cristãos para com aqueles privados da liberdade: Lembrai-vos dos presos, como se estivésseis presos com eles, e dos maltratados, como sendo-o vós mesmos também no corpo (Hb 13.3). O Salvador afirmou que visitar os encarcerados é um gesto de misericórdia, o qual demonstra, de modo prático, se é genuína a fé daqueles que dizem crer nEle (Mt 25.31-46).
No Brasil, é possível realizar tanto a evangelização quanto a capelania prisional. A Lei de Execução Penal (Lei n° 7.210/1984) garante aos detentos o direito à assistência religiosa, com liberdade de culto, permitindo-se-lhes a participação nos serviços organizados no estabelecimento penal, bem como a posse de livros de instrução religiosa (Art. 24).
Do ponto de vista dos evangélicos, a capelania prisional é um ministério que tem como principal objetivo levar consolo e atender às necessidades espirituais dos encarcerados. Os voluntários pregam o Evangelho, mostrando-lhes que o Senhor Jesus morreu por seus pecados e os ama incondicionalmente, como a qualquer outro ser humano.
Nesse contexto, a distribuição de exemplares das Escrituras Sagradas é essencial para os trabalhos de evangelização, uma vez que, conforme registrado nesta reportagem, a leitura da Bíblia promove alívio emocional e espiritual aos presos. (*Colaborou Élidi Miranda, com informações de Capelania brasileira)