POR QUE O MAL EXISTE?
15/12/2024CRISTÃOS “RADICAIS”
Atletas evangélicos impulsionam modalidades esportivas de aventura e testemunham a fé em Cristo
Por Marcelo Santos
Durante a final de skate street da última edição da Olimpíada de Paris, realizada na Arena de La Concorde, a skatista maranhense Rayssa Leal se dirigiu a uma das câmeras de transmissão e, usando a Língua Brasileira de Sinais (Libras), enviou uma mensagem inspirada em João 14.6: Jesus é o Caminho, a Verdade e a Vida. Se antes a medalhista de bronze e uma das melhores do planeta era conhecida na mídia pelo apelido de fadinha, depois daquele recado, o mundo inteiro ficou sabendo que a brasileira é evangélica – membro da Igreja Batista de Imperatriz, no estado do Maranhão.
O vídeo de Rayssa ganhou imediatamente os noticiários, as publicações de portais da internet e postagens nas redes sociais. No entanto, a mensagem gerou polêmica e quase resultou em punição, uma vez que o Comitê Olímpico Internacional (COI) proíbe que atletas façam manifestações políticas ou religiosas durante os Jogos. Porém, a corajosa iniciativa da skatista contribuiu para impulsionar tanto a prática dos esportes radicais como a fé em Jesus.
Tal como o skate, outros desportos do mesmo segmento ganharam enorme projeção após os Jogos Olímpicos. Entre eles, estão o surfe, que teve a participação do evangélico Filipe Toledo, bicampeão mundial em 2022 e 2023 do circuito profissional da World Surf League (WSL, a sigla em inglês), e o BMX, modalidade na qual os competidores disputam, de bicicleta, corridas em pistas repletas de obstáculos e curvas acentuadas. A inclusão desses esportes na Olimpíada de Tóquio 2020 (que ocorreu em 2021 devido à pandemia de covid-19), tornou-se um marco, porque destacou a importância da habilidade extrema dos atletas em desafiar seus limites físicos e emocionais constantemente.
Muitos desses atletas “radicais” encontram inspiração e força na fé em Cristo, considerando-a parte essencial da jornada esportiva. É o caso do Pr. Bruno Taioli Jr., 55 anos, um veterano no skate e na fé cristã. Responsável pela plantação de uma igreja na favela do Sapé, no bairro do Butantã, zona oeste de São Paulo (SP), o ministro do Evangelho tem mais de 45 anos de experiência na modalidade: aos dez, ganhou de presente seu primeiro skate.
Entretanto, a vida dele foi marcada por altos e baixos, incluindo um longo envolvimento com drogas que o afastou da família e das quatro rodinhas de poliuretano. Depois de anos de dependência e internações, Bruno encontrou no Salvador a coragem e a força para se reerguer. “A minha vitória mais importante foi me entregar a Jesus. Ganhei campeonatos e assinei patrocínios, mas nada se compara aos encontros que só pelo favor de Deus pude ter.”
Bruno avaliou positivamente a demonstração pública de fé da jovem skatista Rayssa Leal. “Foi mais que genial: uma condução do Espírito Santo de Deus”, definiu o pastor, destacando que aquela declaração teve impacto inclusive fora do meio do skate, modalidade que convive bem com a diversidade de crenças.
Assim como Rayssa, Bruno Taioli usa seu testemunho pessoal para influenciar outros skatistas, levando o Evangelho às pistas. “Nosso comportamento fala mais alto do que uma pregação direta. Nossas atitudes e condutas formam uma boa plataforma para levar Cristo às pessoas. Temos de ser exemplos, imitadores de Jesus”, enfatiza ele, assinalando que os princípios esportivos, como a resiliência, o respeito ao próximo e a valorização do trabalho em equipe, são compatíveis com os ensinamentos cristãos. “O skate tem em si a superação: o cair e levantar.”
Bruno continua ativo no cenário esportivo, participando de competições na categoria Legends, que contempla skatistas com idade a partir de 35 anos. “Deus ama muito esse esporte, tanto que tem uma passagem na Bíblia de um rolê de skate”, brinca o pastor, citando um conhecido texto do livro de Ezequiel (Ez 1.15-21) e fazendo uma leitura pouco ortodoxa da visão daquele profeta do Antigo Testamento. “Querubins dropam [manobra na qual o skatista inicia a descida de uma rampa] dos céus com um skate, em uma convenção bíblica épica, histórica e que acontece até hoje de skateboard [termo em inglês que significa algo como “patins em uma prancha“]. E ninguém venha me falar que os ‘caras’ não estavam de skate”, empolga-se.
Incentivo e inspiração – Ovice-presidente da Missão Atletas de Cristo, o Pr. Marcos Grava, da Primeira Igreja Batista de Santo André (SP), afirma: “Os esportes radicais sempre tiveram uma boa aceitação do público, sobretudo dos adolescentes.” Atuante no Brasil há 40 anos, a missão, que se popularizou durante as Copas do Mundo, especialmente no período da campanha do tetracampeonato mundial em 1994, está presente em grandes eventos esportivos, como os Jogos Olímpicos. “Nosso papel é o mesmo: mostrar para a Igreja brasileira que o esporte faz parte do nosso cotidiano como cristãos.”
Segundo Grava, a visibilidade de atletas evangélicos nas competições internacionais tem mostrado que o testemunho de fé pode inspirar e encorajar os seguidores de Jesus. “A postura da Rayssa e de outros atletas incentiva os demais irmãos a deixar sua mensagem de amor a partir do Evangelho”, sublinha. O pastor ressalta ainda que em eventos, como os Jogos Olímpicos, “a audiência é muito maior e, por isso, cresce a possibilidade de o testemunho ganhar mais alcance”.
O ministro batista critica as barreiras impostas para que os atletas cristãos expressem a fé em competições, argumentando que a Declaração Universal dos Direitos Humanos diz que a liberdade de manifestação religiosa é um direito fundamental e, portanto, os atletas deveriam ser livres para vivenciar e compartilhar a fé que professam. “Mais do que nunca ecoam as palavras de 1 Coríntios 9.24-25, quando o apóstolo Paulo declara que a nossa principal conquista não é um prêmio terreno, mas a vida eterna.”
O jovem atleta Filipe Siqueira Lopes, 22, pratica BMX há oito anos. Evangélico e morador de Jaraguá (GO), ele explica que encontrou nessa modalidade esportiva uma forma de vida saudável, desafiadora e cheia de conexões. “O esporte, por sua natureza radical, desafia-me a cada treino, mas também permite que eu me conecte com novas pessoas.”
Ao ser indagado sobre a inclusão do BMX nos Jogos Olímpicos, Filipe disse que é um marco importante para a visibilidade da modalidade ainda pouco conhecida por muita gente. De acordo com ele, as competições olímpicas mostraram ao mundo que não se trata de “pessoas andando em bicicletas de criança”, referindo-se ao tamanho da bike. “Atletas literalmente arriscam a vida nela”, observa, evidenciando que há um enorme grau de dificuldade e de beleza nas manobras executadas, completando: “apenas músculos não são suficientes, é preciso ter fé para competir.”
Missão evangelizadora – Adepto da adrenalina, o paraquedista Josué Gonçalves da Silva, 59 anos, uniu a paixão pelo esporte ao evangelismo. “Para evangelizar um paraquedista, você tem de ser um deles”, explica o presidente do Clube de Paraquedistas Evangélicos do Brasil (CPEB), ex-instrutor de paraquedismo e pastor da Igreja Batista Céu Abençoado, em Nova Iguaçu (RJ), na Baixada Fluminense. Silva relata que já fez quase dois mil saltos e alcançou alguns recordes. Com isso, é claro que não faltam histórias para contar. “Formei incontáveis alunos que hoje são feras do paraquedismo mundial. Há uma parte deles morando na Itália, na Espanha, nos Estados Unidos e aqui no Brasil – alguns no Rio de Janeiro.”
De acordo com Josué, para fazer parte do clube de paraquedismo, é necessário que o praticante tenha compromisso com a igreja local e uma conduta ética, a fim de ajudar a construir uma comunidade cristã saudável e unida, na qual as futuras gerações também possam participar e crescer no ambiente do clube.
Ao longo dos anos, Josué e sua equipe participaram de diversos eventos: de aniversários de cidades até grandes shows e competições esportivas. “Nós saltávamos e, depois, pedíamos 15 minutos ao microfone para falar de Jesus. Nunca fomos barrados.”
Expressão da fé – Na visão da obreira Ana Carolina Barros Guimarães, 47 anos, que atua no ministério Jovens que Vencem (JQV) da sede estadual da Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD) em São Paulo, a presença de atletas cristãos nos esportes radicais, assim como em outras modalidades, é relevante. “Vi, nas redes sociais, muitas postagens de atletas olímpicos que anunciaram Jesus de alguma forma. Acredito que isso nunca tenha acontecido de maneira tão evidente”, observa.
Segundo Ana Carolina, as Olimpíadas, que, até certo tempo pareciam representar uma barreira ao testemunho cristão, tornou-se uma vitrine para a expressão da fé dos atletas. “Os Jogos Olímpicos tinham tudo para ser contrários ao Evangelho, mas o Senhor mostrou que as pedras clamam”, destaca ela, referindo-se às palavras de Jesus registradas em Lucas 19.40.
A obreira lembra-se do que fizeram em Paris 2024 os atletas da República de Fiji, pequeno país da Oceania, que louvaram a Deus nos quartos da Vila Olímpica, atraindo a atenção de outros competidores. O fato ganhou repercussão mundial após uma atleta australiana gravar e publicar o momento em suas redes sociais. Conseguir levar as Boas-Novas a um ambiente secular, na opinião de Ana, é a prova do poder transformador de Jesus. “Às vezes, nós ficamos limitados, presos à ideia de que há ‘lugares certos’ para um cristão estar”, ressalta, salientando que é essencial que haja pessoas de fé “radicalizando” em todas as esferas da sociedade.